O Novo mundo do Trabalho na Sociedade 5.0: Como a empresa deve se adaptar

 

Ana Carolina Cassinelli

Ana Cristina Limongi-França

Basilio V. Dagnino

RESUMO

As empresas se encontram diante de um novo desafio: como se adaptar ao “Novo Mundo do Trabalho”? Este artigo apresenta elementos para a gestão empresarial no que parece ser o novo ambiente para o Mundo do Trabalho, com o objetivo de sinalizar as mudanças atuais e os caminhos para o melhor enfrentamento na perspectiva da gestão de qualidade das empresas.  A partir de um breve histórico da evolução da consciência global e local da vida no trabalho, aborda-se o ambiente do trabalho em si, algumas das múltiplas métricas da produtividade, e as percepções sobre possíveis os perfis de liderança. Os caminhos e os descaminhos da gestão da qualidade e da inovação são expostos, bem como a gestão e combinação de papéis na Sociedade 5.0. Propõe-se, como reflexão e como desafio ao empresariado ao enfrentar as demandas de adaptação no novo cenário, adotando como resposta da liderança uma nova interpretação para VUCA, proposta por Bill George, que é: Vision, Understanding, Courage and Adaptability. Neste artigo são apresentadas recomendações, nos processos de planejamento para os novos tempos de pensamento estratégico. Enfim, criação de uma “nova empresa” em decorrência da irreversível e cada vez maior adoção do “novo mundo do trabalho”.

Palavras-chave: Novo Mundo do Trabalho, Líderes da Nova Empresa,  Qualidade e Inovação,  Sociedade 5.0.

 1. TRABALHO: ORIGENS, PRODUTIVIDADE E MÉTRICAS

Marcos históricos iluminam as memórias e crenças mais exigentes dos primórdios do Mundo do Trabalho: Leakey e  Lewin em Origens (1980) descrevem uma linha de produção de lâminas de pedra, com atividades coletivas e integradas, há estimados 60 mil anos atrás. Já naqueles tempos primórdios os elementos do trabalho poderiam ser identificados: a atividade laboral em si, o contrato de trabalho – formal e psicológico, a ergonomia dos postos de trabalho e as competências, conforme descritos na Figura 1, a seguir:

 Do ponto de vista dos Modelos de Negócios, das Escolas de Pensamento Econômico, das concepções Sociotécnicas e das Métricas de Produção, estes elementos estão de forma diversificada em todo o planeta. Destaca-se que Os espaços de trabalho – que com as necessidades atuais dos Home Office ampliaram de forma exponencial sua importância estratégica. Alguns dos espaços estão apresentadas na Figura 2, a seguir:

2. MARCOS E ELEMENTOS DE GESTÃO NO BRASIL

Entender o Trabalho a partir da tecnologia massiva, volume colossal de dados e relações multicontratuais, bem como evidências de distância imensas entre miséria e riqueza, tem mobilizado as empresas a construírem novos modos de produção que afetem positivamente o Mundo do Trabalho, como a proposta amplamente difundida dos Critérios de Sustentabilidade ESG.

Para localizar os principais marcos e elementos de gestão, as Figuras 3 e 4: Evolução da Gestão nas Organizações, apresentam parte dos elementos que caracterizam as Empresas no Brasil a partir dos anos cinquenta até os primeiros vinte anos do Século XXI. Destarte quando surgiram os novos desafios sanitários, econômicos e de gestão organizacional da Pandemia, o Mundo do Trabalho, a partir das práticas já existentes e de conhecimentos acumulados, muitas vezes nunca utilizados, foram instantaneamente mobilizados por força das circunstâncias.

Figura 3 : Marcos da Gestão nas Organizações no Brasil 1950-2019

 

Figura 4: Cenários do Século XXI

Este novo cenário impacta a vida nos aspectos econômicos, sociais, psicológicos e organizacionais, entre outros.  Novas habilidades de várias naturezas especialmente as empresariais, relacionais, emocionais, tecnológicas e sanitárias necessárias, até para a própria sobrevivência.  O ciclo de mudança tem se tornado cada vez mais curto e gerado a necessidade de aprender e criar soluções aderentes a estes novos cenários.

3. A CONSCIÊNCIA GLOBAL E O LOCAL DA VIDA NO TRABALHO

Pesquisa realizada nos EUA e no Canadá, em abril de 2021, com 2.200 respondentes pela Flexijobs/Statista evidenciou que 65% preferem o trabalho remoto, o que tem gerado novos arranjos de alocação de postos de trabalho, diversos dos anteriores à eclosão da Pandemia da COVID-19, conforme mostra a Figura 5:

 

Figura 5: Preferências sobre local para realização do Trabalho Remoto ou Híbrido:

 

4. CAMINHOS E DESCAMINHOS DA GESTÃO DA QUALIDADE E INOVAÇÃO

As vertentes da inovação não têm limites, sendo irmã gêmea da criatividade. O perigo latente é que a corrida contra o tempo, em particular para o lançamento de produtos e serviços no mercado, pode resultar em insucessos pela falta do cumprimento das etapas recomendadas. Por essa razão, é importante equilibrar esse senso de urgência com as fases de pesquisa do mercado e das necessidades e expectativas do cliente, planejamento estratégico, de comunicação e marketing, dos processos e da cadeia de suprimento, dos serviços pré e pós-venda. Com esse cuidado inovação e qualidade andarão de mãos dadas.

Pode-se inovar na estrutura organizacional da empresa, da tradicional hierárquica à matricial, desta para a circular, ou simplesmente de algo mais informal. Essa seria uma inovação interna, como a introduzida pela SERASA, três vezes reconhecida com o Prêmio Nacional da Qualidade, com dois diretores em cada área de negócios, um para gerenciar a rotina do dia a dia, e outro para pensar fora da caixa, em novos produtos e serviços, processos e mercados. A inovação aberta – já é uma realidade de alto impacto –  envolvendo clientes, fornecedores, universidades, institutos de tecnologia, empregados e até concorrentes, conforme o caso.

O termo inovação disruptiva, com a solução de continuidade radical como a propiciada pela digitalização, tem de um lado gerado empresas vencedoras, e de outro praticamente alijado do mercado grandes empresas tradicionais, como é o caso da Kodak.

5. LIDERANÇA E O NOVO MUNDO DO TRABALHO

No que se refere à liderança – a influência sobre pessoas, grupos e sistemas – agora ocorre em tempos voláteis, incertos, complexos e ambíguos. E novas habilidades são necessárias para enfrentar esse novo cenário. O ciclo de mudança tem se tornado cada vez mais curto e gerado a necessidade de aprender e criar soluções aderentes a estes novos cenários.

Com base em pesquisas de pulso da Korn Ferry em mais de 4000 organizações e análise de Organization Scan em mais de 650 organizações, foi constatado que estas mudanças se intensificaram pós-pandemia, onde75% das organizações passaram a operar totalmente online, o que se refletiu na necessidade de mudança cultural e no estilo de liderança, assim como na demanda por novos repertórios de competências. Algumas indagações fundamentais:

  1. a) Quais os fatores de sucesso neste processo? Um fator comum nas organizações de sucesso é que estas tendem a pensar fora da caixa e desafiam seu time a fazer o mesmo. Cargos em empresas transformadoras de sucesso são mais fluidos do que estáveis, enfatizando a colaboração e gerenciando a complexidade. (10% mais complexidade do que em organizações semelhantes).

Outro fator relevante identificado que incentiva a rápida transformação é a utilização de metodologias que possibilitam entregas em menor espaço de tempo e suas devidas correções de “rota” em caso de insucesso. Neste momento fértil para mudanças, é fundamental que cada organização projete conscientemente seu próprio futuro.

  1. b) Qual a importância da flexibilidade no exercício da liderança? A flexibilidade, aprendizagem rápida e autoconsciência são combinações fundamentais para a criação de soluções e adaptação às demandas externas. Aqueles que se mostraram ágeis, sem medo de mudanças, dispostos a operar em águas desconhecidas, estão mais propensos a obterem sucesso em ambientes como o que vivemos hoje, assim como aqueles que foram além de suas zonas de conforto e mostraram inovação no desenvolvimento de soluções.
  2. c) Como devem ser realizados os processos de Recrutamento e Desenvolvimento?

As organizações estão aprendendo a recrutar e desenvolver para agilidade. Eles precisam construir uma força de trabalho qualificada para interpretar tendências, antecipar a transformação, e ADAPTAR-SE rapidamente.

  1. d) O que fazer com as Burocracias? Burocracias farão as organizações sofrer, junto com riscos não calculados. Gerenciar esse equilíbrio crítico será crucial para a construção de cenários que não são mais copiados, e sim co-criados com base em dados oriundos da análise de tendências político-econômicas e hábitos de consumo.
  2. e) Quais são as habilidades, competências e perfil deste “Líder”? Considerando este cenário de transformação constante, as organizações precisarão de uma nova representação de liderança. Os modelos atuais atendem em parte esta demanda, porém o estudo realizado pelo Korn Ferry Institute revela que o representante apto a liderar as organizações frente a estas circunstâncias é um novo tipo líder: o líder auto-disruptivo. Destacam-se nesta pesquisa cCinco aspectos da liderança preparada para o futuro: as dimensões ADAPT, sigla em inglês que engloba a habilidade de antecipar, impulsionar, acelerar, fazer parcerias e confiar.
  3. f) O que são Líderes auto-disruptivos? São os que aprendem agilmente, são autoconscientes, têm inteligência emocional e social, são voltados ao propósito e assertivos, mas humildes. Modificam proativamente seus próprios métodos e atitudes, o que lhes permite acompanhar os ambientes em rápida transformação que ameaçam seus pares mais lentos. Mentalidades flexíveis no topo permeiam toda a organização e permitem que cada indivíduo vivencie a mudança e tenha sucesso em um cenário que se transforma.

O estudo mostra alguns pontos desafiadores a superar nesta encruzilhada, conforme Figura 6: Estamos em uma encruzilhada no mundo do trabalho, a seguir:

 

6. ENFRENTANDO AS INCERTEZAS E COMPARTILHANDO NOVOS HORIZONTES NA SOCIEDADE 5.0

 O Novo Mundo do Trabalho já é uma realidade no Brasil e Globalmente. Cercados de controvérsias. Este Novo Mundo parece ser uma realidade sem volta, com novas naturezas, regras, expectativas, competências, entregas, direitos e deveres.

Se os motoristas do Uber e os motociclistas do iFood – por exemplo são empregados e devem ter carteira assinada ou são trabalhadores autônomos. Da mesma forma: o trabalho ocasional ou descontinuado como previsto nas alterações da CLT. Com a digitalização em todos os seus variados aspectos o nível de competência tem que ser cada vez maior e especializado. Um exemplo real e típico é o do eletricista quando sua indústria da área de produção de gravações de músicas foi automatizada e ele precisava de conhecimentos de eletrônica e TI que não possuía. Agora a empresa está ameaçada de fechar, inicialmente pelo acesso pela Internet, e agora pelo crescimento da oferta de serviços on demand de música clássica e popular. O mesmo fenômeno está ocorrendo com os filmes e com a TV paga. Outro exemplo na área cultural são os livros eletrônicos, de custo baixíssimo e que vão progressivamente dominando o mercado.

Assim, além do teletrabalho, também denominado trabalho remoto e home office com suas peculiaridades, as relações trabalhistas estão sofrendo uma revolução quântica. Dimensionar a força de trabalho com base na demanda nem sempre previsível do mercado, atualizá-la continuamente sob o aspecto técnico, decidir qual o regime legal mais apropriado, onde coloca em xeque as subcontratações como a terceirização, enfim, o empresário tem que reagir rapidamente a todas essas incertezas.

A especialização cada vez maior é inevitável, mas isso sem prejuízo da necessidade dos generalistas em muitas áreas. A redundância de mão de obra e seus aspectos humanos é outra questão: como manter a empresa sobrevivendo a crises considerando o lado social do trabalho?

Segundo a síntese da professora Márcia Vainer, em abril de 2021, inspirada nos estudos de FUKUYAMA, 2018 a Sociedade 5.0 tem as seguintes características:

 

7. OS HORIZONTES DA NOVA EMPRESA

Como enfrentar esses novos desafios? Sugestões para as empresas otimizarem seu funcionamento no ambiente do Novo Mundo do Trabalho são apresentadas a seguir:

  1. Prover rotinas e infraestrutura necessários para a dissipação da cultura organizacionais, assim como engajamento para uma melhor performance e reconhecimento de esforços individuais em direção a um objetivo coletivo.
  2. Desenvolver uma cultura que seja aderente e se conecte com a estratégia da companhia. Para isto, rever com frequência processos existentes de gestão de pessoas – sucessão de liderança, recrutamento & seleção, avaliação de desempenho, reconhecimento e recompensa e desenvolvimento de carreira para alcance de resultados sustentáveis.
  3. Impulsionar o pensamento disruptivo e colaborativo de seus integrantes, garantindo um ambiente propicio onde profissionais consigam lidar com a ansiedade e o estresse ao mesmo tempo que alcancem alta performance.
  4. Estabelecer estruturas organizacionais favoráveis a entregas mais ágeis e menos burocráticas para simplificar e garantir uma sistemática dinâmica.
  5. No caso de empresas em que o trabalho presencial é indispensável como no caso das indústrias, clínicas e consultórios, transporte público, prover equipamentos de proteção individual necessários para máxima proteção, alterar o layout das instalações para garantir o afastamento requerido, e promover campanha de esclarecimento para o estrito cumprimento das ações que evitem eventual contaminação como vacinação, lavagem das mãos etc.
  6. Mobilizar toda a empresa em todos os níveis para a inovação aberta, promovendo a participação de clientes, fornecedores, universidades, institutos de tecnologia e outras partes interessadas, afetadas ou envolvidas, no aprimoramento dos produtos e serviços atualmente oferecidos, e no lançamento de novos.
  7. Manter contato direto e permanente com os fornecedores nacionais e internacionais, se for o caso, para identificar qualquer ameaça à interrupção na cadeia de suprimento, sempre que possível identificando previamente fontes alternativas.
  8. Automatizar o máximo possível os processos de gestão, produção e prestação de serviços, de forma a torná-los mais ágeis e confiáveis.
  9. Incrementar treinamento, qualificação, requalificação, certificação e realocação da força de trabalho como necessário de acordo com as exigências das novas circunstâncias e de desafios, utilizando educação à distância e mentoring.
  10. Garantir o bem-estar do colaborador já estava em destaque quando a COVID surgiu. A pandemia mudou a perspectiva do bem-estar do funcionário para a saúde mental no local de trabalho virtual “sempre on-line”
  11. Analisar a conveniência de introduzir na empresa as técnicas de Inteligência Artificial, Realidade Aumentada, Block Chain, Agile, Big Data, QR Code, RFID, Internet das coisas, SCRUM e ESG.
  12. Implementar referenciais de gestão como a norma ABNT NBR ISO 9001 (e outras, inclusive para obtenção de certificação) e o Modelo de Excelência de Gestão – MEG criado pela Fundação Nacional da Qualidade – FNQ, inclusive para apresentação de candidatura para reconhecimento pela inciativa “Melhores em Gestão”.

8. CONSIDERAÇÕES FINAIS

 O “Novo Mundo do Trabalho” veio para ficar, quanto a isso não há dúvida. Embora a pandemia da COVID-19 tenha acelerado exponencialmente sua chegada, muitas inciativas em nível mundial têm apontado para a introdução de práticas inovadoras no relacionamento capital–trabalho.

Uma delas a destacar, é a criação nos EUA da Business Roundtable, instituição que reúne as maiores empresas americanas na busca da definição do “capitalismo das partes interessadas”, isto é, que considere no mesmo nível o lucro e as necessidades e expectativas dos empregados, fornecedores, Governo e sociedade. A ONU com os 17ODS, o World Economic Forum – WEF e a Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico OCDE –  e muitas outras têm realizado ações importantes para o futuro da Humanidade.

Enfim: aplicar o NOVO VUCA relatado no último número da revista britânica Quality World: ao invés do VUCA tradicional (Volatile, Uncertain, Complex and Ambiguous), Bill George, Sênior Fellow da Harvard Business School, sugere uma resposta da liderança com um novo VUCA: Vision, Understanding, Courage and Adaptability. Cabe aos empresários acompanhar todas essas “megamudanças”, contribuindo cada vez mais com suas iniciativas para a qualidade de vida dos brasileiros e do planeta.

Este artigo expressa a opinião dos Autores e não de suas organizações.

Siga-nos nas Redes Sociais

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Posts Relacionados