Vicente Falconi
No início da década de 70 fui a Goiás e aproveitei um final de semana para visitar um amigo de infância que morava numa pequena cidade do interior. Ele era engenheiro de uma empresa e morava em uma casa maravilhosa, num terreno de oito mil metros quadrados. A empresa, além da casa, lhe dava duas empregadas e um jardineiro, além de se responsabilizar por toda a manutenção.
Água, energia e telefone eram de graça. Eles tinham excelente escola para as crianças e um clube maravilhoso que lembrava aqueles filmes que mostram os clubes para os ingleses em suas colônias. Era de dar inveja. Não poderia haver empresa melhor para se trabalhar!
Há coisa de uns cinco ou seis anos encontrei este amigo em plena Avenida Afonso Pena, em Belo Horizonte. Após os cumprimentos iniciais, comentários sobre os cabelos brancos (ambos com bem mais de 60 anos) e trocas de notícias sobre as famílias e os antigos companheiros, ele foi direto ao assunto: “Velho, você vai ter que me arrumar um emprego!”. Naquela época arrumar emprego era “missão impossível”. Mencionei a ele as dificuldades, mas ele insistiu, invocando a velha amizade.
Perguntei o que ele havia aprendido na vida. Você fala outras línguas? Não. Você tem experiência em vendas? Não. Domina a informática básica? Não. Foi uma série de nãos. Ele trabalhou durante 28 anos à mesma mesa e na mesma cadeira. Sua empresa faliu, como era de se esperar, pois uma empresa apenas reflete a sua adaptação ao mundo, o preparo e desempenho de seus funcionários.
Fui para casa impressionado com o fato, mas, para ser sincero, esqueci-me do problema pois estava com a cabeça cheia de outros. No sábado seguinte, pela manhã, estava na cozinha de minha casa tomando café quando toca o telefone. Era ele: “Você encontrou um emprego para mim?”. Respondi a verdade: “Nem mexi no assunto, fulano”. Aí ele me assustou: “É melhor você ter pressa, pois estou com dificuldades para alimentar a família”. Tive que me assentar para acabar de conversar, pois “perdi as pernas” (como poderia uma pessoa, após uma vida, estar nesta situação?). Bem, hoje ele é almoxarife de uma construtora de um amigo nosso. E, segundo este amigo, péssimo almoxarife.
A vida não espera por ninguém. No mundo de hoje o diploma não mais garante uma boa vida. As mudanças são muito rápidas e o aprendizado deve ser contínuo. Cada dia perdido é irrecuperável. Cada um de nós deve se atualizar diariamente e procurar manter-se em forma para o mercado como se fosse “perder o emprego” no dia seguinte.
Uma revista de circulação nacional promove, todo ano, um concurso intitulado “A melhor empresa para se trabalhar”. Tenho a curiosidade de verificar o balanço financeiro de algumas delas: nem sempre casos de sucesso financeiro. A maioria tem lucro, mas destrói valor.
Eu me pergunto: “Que é uma empresa boa para se trabalhar?”. Estou convencido de que é aquela que mantém o funcionário desafiado o tempo todo, aquela que tem resultados “Classe Mundial”. Quando uma pessoa é desafiada a alcançar resultados nunca antes atingidos, ela busca o conhecimento necessário em livros, artigos técnicos, cursos, ajuda de consultores, visita outras empresas, etc. Ela procura e acaba obtendo a habilidade de que precisa a cada momento e é isto que a mantém capaz e atualizada para o mercado.
Isto é o que os japoneses chamam de “Conceito de Crescimento do Ser Humano”. Uma boa empresa, como uma boa escola, deve ser aquela que seja “dura” e onde os mestres exijam muito. Na hora todos reclamam, mas depois todos agradecem.
Minha experiência de vida tem me mostrado que uma empresa “boazinha” nem sempre é o melhor lugar de se trabalhar. Na verdade, todos deveriam estar “incomodados” com as metas difíceis que lhes são colocadas todos os anos. Esta é a grande força motriz do verdadeiro aprendizado. Não conheço aprendizado que não seja um processo sofrido.
Gerenciar é atingir metas (ou resolver problemas o que é o mesmo!). As metas colocadas devem ser suficientemente difíceis a ponto de causar desconforto, mas, ao mesmo tempo, devem ser factíveis. Nós temos sempre que estar nos comparando com os melhores do mundo e o argumento deve ser sempre este: “se alguém já chegou lá porque não podemos chegar também e eventualmente superar?”.
Temos que ter a mentalidade e a atitude da excelência. Este bom gerenciamento é que conduz ao crescimento do funcionário, pois todos têm que “sofrer” para aprender o que for necessário para que os resultados possam ser atingidos.
Outro dia destes, numa revista nacional especializada, saiu uma reportagem sobre uma grande empresa brasileira e seus métodos de trabalho. Esta empresa exige muito do funcionário e mantém um ambiente muito alegre, descontraído, mas de alta competição com metas avassaladoras. A empresa fornece todos os recursos necessários para que as metas sejam alcançadas, paga bônus aos vencedores e ainda dá opção de compra de ações.
Os funcionários desta empresa são constantemente assediados por outras empresas, pois o mercado sabe que estas pessoas são “feras”, absorveram uma cultura de constante insatisfação e sabem transformar os resultados. Os funcionários que ficam na empresa por um longo tempo saem de lá bem de vida. Aqueles que não se adaptam ao ritmo saem.
A empresa é campeã em resultados, tem uma das maiores taxas de valor adicionado do mercado, suas ações são disputadas nas bolsas de valores e transformou-se numa grande multinacional, verdadeiro orgulho para o país. Na minha opinião, esta é a boa empresa para se trabalhar.
Vicente Falconi é sócio fundador e presidente do Conselho de Administração da Falconi Consultores de Resultado, e membro da Academia Brasileira da Qualidade (ABQ).