NBR ISO 18091: a gestão da qualidade em prefeituras

Hayrton Rodrigues do Prado Filho

 

Segundo um estudo da Confederação Nacional da Indústria (CNI) há uma grande diversidade entre os municípios brasileiros, mas, de um modo geral, a saúde também aparece como o principal problema. Considerando a amostra do Brasil como um todo, 45% dos entrevistados escolheram, de uma lista com 19 itens, a saúde como um dos três prin­cipais problemas do município em que residem. Em segundo lugar, tem-se segurança pública com 35%.

Praticamente empatados em terceiro lugar têm-se educação, calçamento de ruas e avenidas e geração de empregos com, respectivamente 24%, 22% e 21%. Em seguida, há um bloco com 10 itens com percentuais variando de 9% a 13%, ou seja, dentro da margem de erro da pesquisa.

Saúde e segurança pública são os principais problemas tanto para municípios do interior como para as capitais e os municípios na periferia das capitais. No entanto, a segurança pública é um problema mais significativo, nas capitais e na periferia. O percentual de assinalações desses cortes são, respectivamente, 39% e 40%. No interior cai para 32%. Educação aparece isolado como o terceiro principal problema nas capitais (com 28% de assina­lações) e na periferia (26%).

Hoje, o município possui autonomia política, legislativa, administrativa, financeira e organizativa, característica relevante e inovadora do federalismo brasileiro. O novo pacto federativo, decorrente da Constituição, prevê a repartição de competências, de responsabilidades, de direitos e obrigações, entre as esferas de governo, o que permitiu, por exemplo, uma melhor repartição de recursos para atendimento às demandas da população e efetivação dos direitos da cidadania.

Contudo, a velocidade com que o processo de descentralização, ou seja, a transferência de competências para os governos locais, ocorreu no país, alcançando várias políticas públicas, e a própria diversidade da realidade dos estados e municípios brasileiros, terminou por limitar as condições para o exercício das competências municipais e compartilhadas com as demais esferas e aprofundou as disparidades locais e regionais do país, em especial pela significativa ampliação do número de municípios.

De fato, um elevado número de municípios, a maior parte constituída após a promulgação da Constituição, depende quase exclusivamente de transferências federais para sua sobrevivência, com baixa arrecadação própria. Portanto, não são capazes de exercer sua autonomia federativa, reconhecida na Constituição.

Assim, aprimorar a gestão pública é colocar em prática a autonomia. Atualmente há um conjunto de princípios orientadores que organizam a boa administração. O uso responsável dos recursos e a observância dos princípios da legalidade, da moralidade, da impessoalidade, da publicidade e da eficiência garantem a continuidade administrativa.

O município possui enorme responsabilidade, a qual recai, em parte expressiva, sobre o Poder Executivo, a quem compete governá-lo, desempenhando funções políticas, administrativas e executivas. As funções executivas constituem a principal responsabilidade do prefeito, cabendo-lhe, sobretudo, as funções que caracterizam as chefias de alto nível, que são planejar, dirigir, coordenar, controlar e articular-se com atores públicos e privados.

Planejar consiste em formular as políticas públicas, selecionar as opções e definir objetivos, diretrizes, programas e meios adequados à realização do que se pretende. O plano de governo, com alcance para todo o mandato, é instrumento precioso para o planejamento.

Dirigir tem o significado de orientar, verbalmente ou por meio de decretos, instruções, ordens de serviço, portarias e outros atos administrativos. O prefeito é o responsável final pelo que acontece na administração, pois dirige a máquina da Prefeitura, ainda que com o auxílio da sua equipe de secretários e dos responsáveis pelos diversos setores.

Coordenar diz respeito a integrar a ação dos diversos órgãos, de modo a evitar o desperdício de recursos com a duplicação e dispersão de esforços. Ter uma visão de conjunto das ações que estão sendo executadas contribui para a tomada de decisões. A atuação de um setor da Prefeitura produz reflexos em outros, pois os temas se comunicam.

Por exemplo, a decisão de construir uma escola, além de envolver a Secretaria de Educação, desencadeará uma série de demandas sobre diferentes setores da Prefeitura, como transporte, obras, saneamento, segurança e saúde. A realização de reuniões e a análise de relatórios periódicos ajudam a identificar pontos sobre os quais o prefeito deve agir. O uso da internet e a construção de rede interna para troca de informações melhoram a comunicação e criam condições para a permuta de informações, facilitando a coordenação.

Controlar é verificar o cumprimento das orientações e o alcance dos resultados desejados. É monitorar as ações permanentemente, por meio de visitas de campo, de auditorias ou de instrumentos como os balancetes mensais – onde se pode acompanhar a execução orçamentária e a movimentação financeira – e os relatórios sobre execução física e financeira dos programas, obras e serviços.

Estabelecer um controle interno, que promova auditoria sobre as fases da receita e da despesa, sobre a folha de pagamento, sobre os contratos em andamento, sobre as licitações e, principalmente, sobre os resultados desses processos, é útil à boa gestão e permite que o prefeito verifique as informações e tenha visão ampla do que está sendo realizado.

B.V. Dagnino, vice presidente da Academia Brasileira da Qualidade (ABQ), fellow pela ASQ (EUA), fellow & CQP pelo CQI (Reino Unido) e diretor técnico da Qualifactory Consultoria (dagnino@uol.com.br), defende o uso da NBR ISO 18091 de 10/2014 – Sistemas de Gestão da Qualidade – Diretrizes para a aplicação da NBR ISO 9001:2008 em prefeituras pelos gestores municipais. “Ela possui o objetivo de fornecer às prefeituras as diretrizes para a obtenção de resultados confiáveis por meio da aplicação da NBR ISO 9001:2008 em uma base integral. Essas diretrizes, no entanto, não adicionam, alteram ou modificam os requisitos da NBR ISO 9001:2008”, explica.

Ele acrescenta que um dos grandes desafios que as sociedades enfrentam hoje é a necessidade de desenvolver e manter a confiança dos cidadãos em seus governos e suas instituições. “A este respeito, as prefeituras têm a missão de tornar possível o desenvolvimento das comunidades locais sustentáveis. A gestão da qualidade em prefeituras pode resultar em prosperidade econômica sustentável e desenvolvimento social em nível local, incluindo a implantação de políticas nacionais e estaduais, e sua interação de uma forma coerente e compatível”, observa.

Os cidadãos esperam ter uma comunidade que forneça todos os produtos/serviços públicos com qualidade, como segurança, estradas em boas condições, disponibilidade de transporte público, facilidade e rapidez no processamento de documentos, transparência e informação pública, disponibilidade dos sistemas de saúde e educação, infraestrutura; eles esperam que todas as suas necessidades sejam satisfeitas. Os cidadãos esperam que a prefeitura os represente e que a sua comunidade esteja bem protegida.

É possível construir gestões municipal, estadual e federal, e até mesmo global, mais fortes, se o trabalho for feito a partir do nível municipal (local), com base na gestão da qualidade dos produtos/serviços públicos e no aumento da confiança dos cidadãos em seus governos em níveis municipal, estadual e federal. Conseguir uma elevada qualidade de governo municipal permite que todo o sistema de governo se torne mais forte.

A coerência de tais abordagens pode ajudar a criar governos confiáveis e sustentáveis em níveis municipal, estadual e federal. Esta norma foi elaborada para fornecer diretrizes para os governos municipais em todo o mundo, para a compreensão e implementação de um sistema de gestão da qualidade que atenda aos requisitos da NBR ISO 9001:2008, a fim de atender às necessidades e expectativas dos seus cidadãos.

O Anexo A da 18091 fornece informações sobre processos típicos de uma prefeitura. O Anexo B apresenta a descrição de um modelo de diagnóstico que pode ser usado como um ponto de partida para a implementação de um sistema de gestão da qualidade integral, tendo em vista tornar o governo municipal confiável.

Para Dagnino, as diretrizes desta norma se destinam a ajudar as prefeituras a relacionar os conceitos de gestão da qualidade, conforme descrito nas NBR ISO 9000, NBR ISO 9001, NBR ISO 9004 e normas associadas, com a prática e terminologia comumente utilizadas no contexto de uma prefeitura. O uso dos termos e definições apresentados nestas orientações podem variar de acordo com a cultura, usos e costumes de cada local e região em que a prefeitura está localizada. Ver também as orientações sobre terminologia encontradas na Referência.

“Espera-se que um plano de desenvolvimento ou programa de trabalho a curto ou médio prazo seja recebido, entendido e aplicado pelos funcionários, executivos e representantes da prefeitura”, acrescenta. “No entanto, o plano ou programa em si não garante que as necessidades e as expectativas da comunidade municipal serão cobertas, se os processos necessários para a efetiva implementação de tais planos ou programas forem deficientes ou inexistentes”.

A necessidade de evitar essas deficiências motivou a elaboração desta norma para ajudar as prefeituras na implementação de um sistema de gestão de qualidade eficaz. Esta norma não assume que as prefeituras busquem a certificação do seu sistema de gestão da qualidade, embora elas possam optar por buscar a certificação pela NBR ISO 9001:2008, se assim o desejarem.

As auditorias internas da qualidade podem fornecer a verificação da conformidade aos requisitos, em conjunto com o controle de queixas ou reclamações de clientes, usuários, cidadãos e comunidade local em geral. Qualquer sistema de gestão da qualidade será influenciado pelas diferentes políticas, objetivos, diversos métodos de trabalho, disponibilidade de recursos e práticas administrativas que são específicos para cada governo municipal.

Portanto, pode-se esperar que os detalhes de cada sistema de gestão

da qualidade varie em cada prefeitura. Não é o método detalhado da implementação do sistema de gestão da qualidade que é importante; o que importa é que o sistema de gestão da qualidade produza resultados eficazes, consistentes e confiáveis. É importante que o sistema de gestão da qualidade seja tão simples quanto possível, a fim de funcionar corretamente; ele precisa ser também suficientemente compreensível para atender às políticas e aos objetivos da qualidade da prefeitura.

A fim de alcançar o objetivo de uma prefeitura confiável, ágil e transparente, não é necessário buscar a certificação para a NBR ISO 9001:2008, embora isto possa ser incentivado por iniciativas governamentais estaduais ou federais. Tampouco se pretende que a conformidade com a NBR ISO 9001:2008 seja considerada um objetivo final em si mesmo: uma vez que uma prefeitura tenha alcançado um nível que lhe permita fornecer produtos/serviços consistentes para a comunidade local, é importante que vá além da conformidade aos requisitos, e que considere o uso da NBR ISO 9004 e/ou outros modelos de excelência para melhorar a sua eficiência global.

Para uma melhor compreensão de modelos de excelência, ver a NBR ISO 9004:2010, Anexo A (ferramenta de autoavaliação), e os modelos de prêmios da qualidade. De acordo com a NBR ISO 9000:2005, para que uma organização seja bem-sucedida, ela precisa ser guiada e controlada de uma forma sistemática e transparente. Isto é particularmente verdadeiro para a prefeitura, onde a transparência e a prestação de contas aos seus clientes cidadãos são vitais, a fim de ganhar sua confiança.

“O sucesso sustentado só irá resultar a partir da implementação de um sistema de gestão integral da qualidade que atenda às necessidades e expectativas de todas as partes interessadas. Por isso, é importante que o sistema de gestão da qualidade de um governo municipal confiável e bem-sucedido abranja todas as atividades e processos que possam afetar sua capacidade de satisfazer as necessidades e expectativas de seus clientes cidadãos, os requisitos legais e regulamentares aplicáveis ao produto, e os requisitos próprios do governo local, bem como os de outras partes interessadas, como governo estadual e federal”, complementa.

Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o Brasil tem, atualmente, 5.564 municípios. O estado com maior número de municípios é Minas Gerais, com 853. São Paulo aparece em segundo lugar, com 645 municípios.

Em 2004, o número total de municípios era de 5.560. Mas, daquele ano até agora, foram criados dois municípios em Mato Grosso, um em Mato Grosso do Sul e um no Piauí. O Distrito Federal (DF) corresponde a apenas um município, e o Tocantins, estado criado mais recentemente, já conta com 139 municípios.

Tanto a Constituição federal quanto as constituições estaduais asseguram autonomia aos municípios, regidos por uma Lei Orgânica aprovada por dois terços dos membros da Câmara Municipal. A Lei Orgânica Municipal está para o município assim como a Constituição federal está para o país. O prefeito é o chefe municipal, escolhido entre maiores de 21 anos para exercer um mandato de quatro anos, conquistado por meio de eleições diretas e simultâneas.

Na condição de chefe do Executivo municipal, o prefeito tem atribuições políticas e administrativas que se consolidam em atos de governo e se expressam no planejamento de atividades, obras e serviços municipais. Cabem ao prefeito, ainda, a apresentação, sanção, promulgação e o veto de proposições e projetos de lei. Anualmente, o Executivo municipal elabora a proposta orçamentária, que é submetida à Câmara dos Vereadores.

Parcela das receitas federais arrecadadas pela União é repassada aos estados, ao Distrito Federal e aos municípios. Cabe ao Tesouro Nacional, em cumprimento aos dispositivos constitucionais, transferir esses recursos nos prazos legalmente estabelecidos.

Dentre as principais transferências constitucionais da União para os estados, o DF e os municípios, destacam-se o Fundo de Participação dos Estados e do Distrito Federal (FPE); o Fundo de Participação dos Municípios (FPM); o Fundo de Compensação pela Exportação de Produtos Industrializados (FPEX); o Fundo de Manutenção e de Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (Fundef); e o Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural (ITR).

O FPM é composto por 22,5% da arrecadação do Imposto de Renda (IR) e do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI). A distribuição dos recursos aos municípios é feita de acordo com o número de habitantes, sendo também fixadas faixas populacionais, cabendo a cada uma delas um coeficiente individual. O mínimo é de 0,6 para municípios com até 10.188 habitantes e o máximo é de 4,0 para aqueles com mais de 156 mil habitantes.

Do total de recursos do FPM, 10% são destinados às capitais, 86,4% aos demais municípios e 3,6% ao fundo de reserva para os municípios com população superior a 142.633 habitantes (coeficiente de 3,8), excluídas as capitais. Os critérios atualmente utilizados para o cálculo dos coeficientes de participação estão baseados na Lei 5172/66 (Código Tributário Nacional) e no Decreto-Lei 1.881/81.

“Enfim, somente com a integração da boa gestão com a aplicação adequada dos recursos disponíveis o desenvolvimento local será alavancado e, consequentemente, melhorada a qualidade de vida dos munícipes”, finaliza Dagnino.

 

 

Hayrton Rodrigues do Prado Filho é jornalista profissional, editor da revista digital Banas Qualidade e membro da Academia Brasileira da Qualidade (ABQ) – hayrton@hayrtonprado.jor.br

Este artigo expressa a opinião dos Autores e não de suas organizações.

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