A interação entre Análise do Valor e Design Thinking favorecendo a Qualidade

Tumisu / Pixabay

João Mário Csillag

 

Uma organização para cumprir sua finalidade precisa inovar, e muito, lançando produtos e serviços que façam a diferença, em caso contrario ela não sobrevive. Duas ferramentas importantíssimas para a inovação são a Análise do Valor e o Design Thinking.

A análise do valor (AV) surgiu quando Lawrence Miles , um executivo da GE, foi incumbido de adequar o que fornecedores poderiam entregar para a linha de montagem numa época de falta de peças e materiais devido ao esforço militar da época. Quando terminou a guerra e pediram a ele retornar com as especificações originais, desde que a disponibilidade de insumos foi conseguida. Sua resposta foi desconcertante, pois ele questionou seus chefes “para que mudar se está mais barato e o desempenho é idêntico?”.

Estava criada a AV, conhecida posteriormente com outros nomes como Gerenciamento do Valor, Projetos do Valor, Design do Cost, entre outros. O conceito fundamental da AV é a função, que é o que se espera de um item, produto ou serviço.

Esta metodologia expandiu rapidamente por diferentes países, começando pela Inglaterra, seguida pelos países europeus e também no Brasil. Os resultados foram surpreendentes, tanto que em muitas empresas foram criados setores que cuidavam da AV, inicialmente entre fabricantes e posteriormente entre prestadores de serviços. Atualmente esta metodologia está disseminada e é tarefa de todos independentemente do departamento a que pertencem, assim como a Qualidade nas empresas mais criativas.

Uma ferramenta que aumentou o poder da AV foi o diagrama FAST (functional analysis system technique), que permite encadear funções do detalhe para o mais amplo, respondendo “para que?” e o contrário respondendo o “como?”. Assim, se quisermos aplicar este raciocínio para um lápis, perguntamos “como” e a resposta viria na função seguinte.

Qual a função de um lápis? Marcar papel, e como o lápis marca papel? Contrastando cor, e como contrastar cor? Depositando meio, e como depositar meio? Aplicando pressão. Na medida em que progredimos neste sentido, entramos no nível de mais detalhes.

Por outro lado, quando queremos aumentar o nível de abrangência, a pergunta a ser feita é: Por quê? Ou para que? (do inglês Why). Assim, perguntando “para que marcar papel?” Para registrar dados e para que registrar dados? Para armazenar informação e assim por diante. Formamos assim uma sequência de funções desde armazenar informações até aplicar pressão.

Basta escolher uma função qualquer, mais abrangente, que teremos como consequência um maior leque de opções para o aparecimento de novas oportunidades, facilitando o aparecimento de ideias criativas e ajudando a resolver o problema em questão. Assim, temos maior quantidade de opções para armazenar informações do que para marcar papel e também mais opções para marcar papel do que aplicar pressão.

Esta análise chamada de abordagem funcional tem como objetivo compreender o assunto a ser abordado. Em seguida, basta escolher a função adequada e procurar maneiras alternativas de desempenhá-la, utilizando técnicas de geração de ideias.

A seleção das melhores é feita com uma ferramenta própria para em seguida vir a implementação. Em resumo, existe uma série de etapas que chamamos Plano de Trabalho, composto de fases convergentes, usando técnicas racionais, e divergentes usando técnicas criativas.

O Design Thinking (DT) teve como precursores David Kelley e Alex Osterwalder. Em essência, o DT também se compõem de etapas divergentes com as mesmas funções de criar opções e convergentes fazendo as escolhas necessárias, a exemplo da AV. Para cada uma delas existem metodologias e técnicas, tendo em vista incorporar novas maneiras para permitir concretizar um desejo e verificar sua viabilidade e praticabilidade de uma maneira simples.

A grande novidade que o DT trouxe, foi a prototipagem e a narrativa, ferramentas muito potentes para gerar resultados com rapidez. O primeiro estágio do DT é a aceitação das restrições mais importantes e a definição de critérios para sua avaliação que devem considerar a praticabilidade, isto é, o que é funcionalmente possível num futuro próximo, a viabilidade implicando no que provavelmente se tornará parte de um modelo de negócios sustentável e finalmente a desejabilidade, o que faz sentido para as pessoas.

Além de solucionar estas três restrições, devemos colocá-las num equilíbrio harmônico. Temos que fugir do óbvio que implica em inovações incrementais, caso contrário, estaremos atulhando produtos e serviços que não são necessários.

A equipe de projetos é fundamental, e é sempre bom trabalhar em grupo, pois “todos nós somos mais inteligentes do que qualquer um de nós”. Dependendo do projeto, convém incluir pessoas com diferentes formações, e aqui é importante deixar claro que uma equipe multidisciplinar não é a mesma coisa que uma equipe interdisciplinar, em que em vez de cada um defender sua própria especialidade, deve colaborar entre as diferentes disciplinas.

Para converter necessidade em demanda, conforme Peter Drucker, precisamos colocar as pessoas em primeiro lugar. As pessoas não tem o hábito de questionar o óbvio, base do conceito de função da AV. Ao não questionar perguntando “por que?” perdemos muitas oportunidades.

A primeira pessoa que fez cientificamente esta pergunta tão importante foi Isaac Newton. Por que as maçãs caem e não voam? Por que temos que nos adaptar a quebra-galhos como: anotar senhas na mão, pendurar paletós em ganchos, ou colocar post-its no computador ou na geladeira e assim por diante. Ao não questionarmos, não percebemos problemas, pois nos adaptamos e consequentemente deixamos de resolvê-los. De Bono, chamou isto de problema do “não problema”.

O importante é ajudar as pessoas a articular suas necessidades latentes que podem nem saber que têm. O DT dispõe de ferramentas que permitem escapar das inovações incrementais e passar para as disruptivas. Há três elementos mutuamente complementares de qualquer programa de design de sucesso: insight, observação e empatia.

O insight, ou introspecção pode ser obtido ao observar as pessoas. Apesar de elas não saberem dizer por que fazem o que fazem, sua observação pode nos mostrar sobre suas necessidades não atendidas.

A observação é fundamental, pois as pessoas continuam fazendo tudo como sempre fizeram, e se adéquam com o que possuem de ferramentas, instrumentos ou hábitos. Devemos observar o que fazem ou deixam de fazer, e ouvir o que dizem ou deixam de dizer.

Em geral é melhor ter como referência os extremos que podem ser comparados para tirarmos conclusões, e não os que estão no meio da curva normal. Certamente, dependendo do caso, os próprios clientes nos dão valiosas informações.

A empatia consiste em desenvolver uma conexão entre os dados coletados com as pessoas que estamos observando, pois a missão do DT é traduzir observações em insights, e estes em produtos e serviços para melhorar a vida das pessoas. As pontes de insight por meio da empatia consistem na tentativa de ver o mundo através dos olhos dos outros, de compreender o mundo por meio das experiências alheias e de sentir o mundo por suas emoções. Uma visita a um pronto atendimento hospitalar pode ser analisado em várias camadas de interpretação.

No primeiro nível é o ambiente físico que ressalta, num segundo nível é o aspecto cognitivo que conta “como o paciente vê a situação?” permitindo identificar as necessidades latentes, isto é, o que pensam, mas não são capazes de articular. Uma terceira camada, além do funcional e do cognitivo, refere-se ao emocional. O que sentem? O que os afeta? O que os motiva?.

A inspiração sempre envolve um elemento de sorte, mas como a “sorte só favorece uma mente preparada” é bom estar com o problema na cabeça. Apesar de o banho não ter sido muito comum no passado, um entre outros é que pronunciou eureka quando percebeu que a água subia quando seu corpo entrava nela.

No DT, a equipe transita por três espaços sobrepostos no decorrer de um projeto: o de inspiração, no qual insghts são coletados de todas as fontes possíveis; um espaço de idealização no qual esses insights são traduzidos em ideias; e um espaço de implementação no qual as melhores ideias são desenvolvidas em um plano de ação concreto e plenamente elaborado. Trata-se de espaços sobrepostos e não de estágios sequenciais de uma metodologia inflexível. Na AV, chamamos estes espaços de plano de trabalho, também composto de preparação, informação, especulação, avaliação e implementação.

Quando pensamos num simples projeto como montar um robô que funciona com peças de lego, seguindo o catálogo, estamos num processo mental controlado, lógico, previsível e com um número conhecido de soluções, chamamos isto de situação “convergente”. Por outro lado, quando pensamos como implementar a Qualidade em nossos órgãos públicos, estamos frente a uma situação não controlada, imprevisível, imaginativa e onde temos alternativas e não soluções, que podemos chamar de “divergente”.

Pois bem, no plano de trabalho da AV, as etapas de informação e especulação são divergentes, enquanto que as etapas de avaliação e implementação são convergentes, exatamente como no DT, onde a inspiração e idealização são fases divergentes, enquanto que a implementação é convergente. Em cada uma delas existem idas e voltas. Na fase divergente, criamos opções enquanto que na fase convergente, eliminamos e combinamos opções.

Como complementos naturais ao pensamento divergente e convergente temos a análise e a síntese. Para compreender problemas complexos, temos que decompô-los por meio de ferramentas analíticas, enquanto que o processo criativo se baseia na síntese, o ato coletivo de juntar as partes para criar ideias completas.

Na AV três ferramentas são fundamentais: a análise das funções, que nos permite compreender melhor o problema, eliminar o bloqueio funcional e facilitar o aparecimento de ideias criativas; o diagrama FAST com que geramos novas funções nos níveis de maior ou menor abrangência; e o diagrama COMPARE que nos ajuda a decidir quando passar para a fase especulativa. No DT após a coleta de dados passamos a um intenso período de síntese, ao identificar padrões significativos e formar uma história coerente. De preferência cativante e verossímil.

Portanto, tanto na AV como no DT, passamos por um movimento contínuo entre processos divergentes e convergentes, por um lado e entre analítico e sintético por outro. Em ambas as metodologias é fundamental o ambiente de otimismo e permissão para experimentar, mesmo com o perigo de redundar em prejuízo.

A energia que é sentida no ar é intensa. Quando visitamos uma empresa onde impera tal ambiente, ocorrem fatos inusitados. Numa visita à Brasilata, em São Paulo, andando na fábrica, vi um operador de prensa, sair do seu posto e recomendar a um visitante, que não tire seus óculos de segurança, quando tentava coçar seu olho. Lá é comum, um operador da linha de montagem (aliás, todos os funcionários são chamados de “inventores”) fazer uma sugestão que resultará em eliminar seu próprio posto de trabalho, pois sabe que não será demitido.

A etapa seguinte é a idealização no DT e especulação na AV. Aqui são utilizadas as conhecidas técnicas que permitem gerar ideias, como o braistorming, pensamento lateral, sinética ou outra. O pensamento visual neste ponto é fundamental, pois um “desenho vale mais que mil palavras” tanto para quem recebe a informação quanto e principalmente para quem quer transmitir, pois ao desenhar estamos compreendendo melhor o que queremos entender e transmitir. Tivemos recentemente em São Paulo uma exposição sobre Leonardo da Vinci, e ficou claro que seus desenhos ilustram bem este ponto.

Transitando entre as etapas, vemos uma diferença entre a AV e o DT. Enquanto na AV, as ideias são montadas para formar alternativas viáveis, sendo uma delas a escolhida seguindo-se a implementação, no DT há a prototipagem, uma maravilhosa ferramenta que deu um enorme impulso ao DT.

Prototipar implica em passar do físico para o abstrato e voltar ao físico, “pensando com as mãos”. Quanto mais rapidamente tornamos nossas ideias tangíveis, mais cedo poderemos avaliá-las, lapidá-las e identificar a melhor solução. Da mesma forma que pode acelerar um projeto, a prototipagem permite a exploração de muitas ideias paralelamente.

Os protótipos iniciais devem ser rápidos, rudimentares e baratos. Quanto maior for o investimento em uma ideia, mais as pessoas se apegam a ela trazendo o inconveniente de chegar ao final e não ser a melhor alternativa para o caso. Quanto mais barato, mais facilmente nos desfazemos dela, maior a oportunidade de descobrir novas e melhores ideias a custo mínimo. Os materiais utilizados são: cartolina, espuma, madeira, isopor grampos, fita adesiva, peças de lego ou qualquer coisa que permite unir itens.

Apenas para ilustrar isto, “quando colaram a esfera de uma embalagem de desodorante roll-on na base de uma manteigueira de plástico, apareceu o primeiro mouse da Apple”. O objetivo da prototipagem é apenas o de dar forma a uma ideia para conhecer seus pontos fortes e fracos com vistas em identificar novos direcionamentos para a próxima geração de protótipos mais detalhados e lapidados.

Fazemos um protótipo para cada ideia. Normalmente a prototipagem ocorre em ambientes controlados. É quando podemos avaliar as características de um produto: funciona? Quebra ao cair? Um mau uso pode danificar? As peças se encaixam bem? É fácil uma pessoa idosa encontrar rapidamente o botão para desligar? No desenvolvimento de óculos de realidade virtual, Tom Ching fez experimentos que merecem ser vistos no Youtube.

A prototipagem também pode ser feita para serviços, pois não passa de uma maneira de explorar uma ideia, avaliá-la e levá-la adiante. Modelos de interface de software podem ser feitos de Post-it antes de uma linha de código ser escrita assim como conceitos de serviços bancários com representações diante de cenários montados com isopor e fita crepe.

No passado, a cada decolagem, as comissárias faziam pessoalmente uma demonstração de como utilizar o cinto de segurança, mascaras de oxigênio e como se comportar em caso de emergências. Uma das nossas companhias nacionais foi a primeira a utilizar um pequeno filme para esta operação, dispensando o trabalho repetitivo para a demonstração, isto não passou de uma prototipagem.

Um enorme valor dos cenários, é que eles nos forçam a manter focados, impedindo de nos perder em detalhes sem importância. A prototipagem dá forma a uma ideia, nos permitindo aprender com ela, avaliá-la em relação a outras e melhorá-la.

O famoso momento da verdade, criado por Jan Carlzon, antigo CEO da SAS, pode ser aqui lembrado com enorme utilidade. Basta mapear os diversos momentos da verdade pelos quais passa um cliente ao longo de uma experiência, que naquele caso era de companhias aéreas.

Cada momento em que o cliente tem contato com a SAS, iniciando com a compra de passagem, o check-in, a espera para embarque, a retirada da bagagem ao longo do voo e assim por diante, constituindo-se em momentos da verdade. Nesta companhia ocorreu o fato de um viajante ao fazer o chek-in, percebeu que havia esquecido seu passaporte no hotel onde havia dormido. A atendente, apenas perguntou qual era o hotel, e procedeu ao check-in.

Telefonou ao hotel, e pediu que o passaporte fosse enviado até o aeroporto e o entregou ao viajante que além de surpreso ficou agradecido. Foi a primeira demonstração de empoderamento. Na prototipagem, cada momento da verdade se constitui numa oportunidade de proporcionar valor aos clientes potenciais de uma empresa.

Para lançar um novo serviço podem ser utilizados protótipos em regiões específicas para testar ideias. Os mundos virtuais como Second Life ou redes de relacionamento sociais podem ser utilizados. As empresas podem aprender com os consumidores sobre marcas ou serviços propostos antes de se comprometer com grandes investimentos.

A prototipagem virtual permite que empresas atinjam rapidamente clientes potenciais e obtenham feedback de pessoas em vários locais diferentes. As interações são fáceis e cada vez mais empresas começam a explorar o potencial de prototipagem das redes de relacionamentos sociais online. Infelizmente recebemos mensagens maliciosas em nossos e-mails que podem contaminar nossas máquinas, isto não deixa de ser um mau uso de protótipos.

O poder da prototipagem é tal que pode até alcançar uma organização como um todo. A HBO, famosa pela criação de séries percebeu que o cenário da televisão estava mudando. Em 2004 já oferecia excelentes conteúdos, mas percebeu que novas plataformas como a televisão pela internet, telefone móvel e vídeo sob demanda estavam destinadas a ganhar importância.

Após pesquisar, surgiu uma estratégia baseada na criação de conteúdo que se espalharia por todas as novas plataformas tecnológicas, como PC’s, tablets, laptops e smartfones. Concluiu que a empresa deveria alterar seu modelo de negócios. Em vez de produzir programas de televisão e depois pensar no que fazer com os DVD’s ou conteúdos móveis, decidiu que os programas seriam criados com esses outros canais em mente, desde o inicio.

Era um plano ambicioso e implicava em alterações profundas. Para desenvolver uma compreensão mais profunda de como o público poderia se relacionar com o veículo, e eventualmente produzisse alterações organizacionais maiores, foram montados protótipos. Isto permitiu que os altos executivos vissem, em primeira mão, como os clientes poderiam interagir com o conteúdo de televisão ao qual seria possível acessar de diferentes dispositivos.

Para a fundamentação técnica e analítica, construíram um mapa futuro que ocupava toda uma parede e mostrava os elementos de tecnologia, negócios e cultura que a empresa confrontaria à medida que o programa progredisse. Isto permitiu tomada de decisão com mais clareza, o que foi útil para a empresa. A própria IDEO de Tim Brown, teve que se reinventar por ocasião da implosão da bolha dos pontocoms no fim da década 2000. Também eles construíram protótipos para deixar claro o que fazer para que a organização que iniciou com 40 funcionários, e já estava com 350, permanecesse flexível, ágil e reativa ao novo ambiente global.

A prototipagem é utilizada em todas as fases de um projeto, sempre com o objetivo de evitar erros custosos, como permitir complexidade demais antes da hora e nos agarrar a uma ideia fraca por tempo demais, sempre pensando com as mãos. A fase inspiracional deve inspirar novas ideias especialmente no inicio de um projeto, quando se fazem numerosos protótipos rapidamente executáveis e muito rudimentares.

Cada um deles tem o objetivo de desenvolver uma ideia, apenas o suficiente para permitir que a equipe aprenda algo e siga em frente. Na fase de realização, o objetivo dos protótipos é o de desenvolver novas ideias visando nos assegurar de que elas incorporem os elementos funcionais e emocionais necessários para atender a demanda do mercado. Na medida em que o projeto avança, o número de protótipos cairá enquanto que a resolução deles aumenta, sempre com o objetivo de ajudar no refinamento de uma ideia e melhorá-la.

Finalmente, no último estágio, o de implementação o objetivo é o de transmitir uma ideia com clareza suficiente para ser aceita por toda a organização ou entidade que no nosso caso é a Academia Brasileira da Qualidade (ABQ), comprovando-a e mostrando que ela funcionará em seu mercado-alvo. Em cada estagio o protótipo pode servir para validar um detalhe do projeto, e serve para avaliar quão bom ele é.

Na Brasilata, já citada, uma empresa que fabrica latas, um produto maduro em que dificilmente podemos imaginar melhorias, possui um setor de protótipos onde são gestados os melhoramentos. Trata-se de uma oficina onde trabalham alguns antigos e experientes funcionários nos quais todos confiam.

Nesta empresa, conseguiram 99 patentes na maioria internacionais. Foi considerada entre as 20 mais inovadoras no Brasil, o melhor lugar para trabalhar por vários anos sucessivos e conseguiram mais de 150 ideias por funcionários ao ano, com 91% de aproveitamento, número maior, senão comparável com o da Toyota no Japão.

Atualmente, uma boa ideia não é mais suficiente, se não for bem executada. Dizemos que inovação é a nova ideia mais ação, trazendo os resultados previstos. No caso de serviços, cada vez mais estamos dando atenção à experiência, em que o consumidor não é mais um personagem passivo, mas sim um participante que pode comandar. Isto ocorre em várias áreas.

O armazém foi substituído por supermercados, hoje não mais compramos partituras para tocar, mas ouvimos músicas e mesmo produzimos músicas. Ferramentas de software permitem baixar músicas e mesmo criar músicas sem necessidade de treinamento formal ou mesmo a capacidade de tocar instrumentos.

Nos voos de pequenos aviões da empresa local da KLM, as informações iniciais do voo eram passadas de mão em mão pelos passageiros, facilitando uma quebra de gelo importante no inicio dos voos. O que vale é a experiência.

Hoje, com os grandes aviões, não é mais possível tal procedimento, imaginaram uma maneira de trazer uma experiência inesquecível. Quando após um voo, um passageiro deixa algum objeto como um celular ou um brinquedo de criança, um cachorro treinado leva correndo, num bolso atado a seu corpo, tal objeto ao dono enquanto estão saindo. Estes passageiros ficam agradavelmente surpreendidos e principalmente emocionados.

O NOMA, em Copenhagen, um restaurante que tem sido considerado o melhor do mundo em sucessivos anos, proporciona uma experiência memorável. Quando você se aproxima do restaurante, alguém sai para te receber e ao adentrar, um exército de chefs nos aplaude e um maitre nos leva para a mesa reservada. Em seguida, alguém pergunta qual o nosso idioma e trazem um assistente que fala nosso idioma, qualquer que seja ele, criando um ambiente acolhedor, e que será nosso interlocutor para a jornada da refeição.

Naturalmente, perguntam ainda por ocasião da reserva e confirmam neste momento nossas restrições alimentares. Em seguida vem um desfile de pratos, cada um harmonizado com um vinho adequado, coisas que jamais comemos, numa grande quantidade de pratos servidos.

Após a refeição, somos convidados para conhecer o restaurante. Lá pudemos verificar no andar superior, mesma área do restaurante, o laboratório de protótipos, onde chefs e estagiários de diferentes países estão continuamente pesquisando e desenvolvendo novos pratos, para as diversas estações do ano, pois podemos imaginar que no inverno, a neve não permite a mesma produção de verduras que durante o verão.

Havia até colmeias para produzirem mel que estava sendo utilizado em pesquisas para novas ideias, o que não deixa de ser uma prototipagem complexa. Na saída, novamente o exercito de chefs que preparam os diferentes pratos, cada um especializado em alguns, se junta para se despedir de nós, tornando esta experiência memorável.

Para qualquer tipo se serviço, quer seja de companhias aéreas, hospitais, supermercados, bancos, hotéis ou restaurantes, a experiência além de nos levar para um mundo confortável com utilidade mensurável também nos conduz para uma zona nebulosa de valor emocional. Em todas elas, deve haver a participação ativa do consumidor, deve também dar a sensação de ser autêntica, genuína e cativante, e para isto ocorrer, deve ser proporcionada por funcionários que trabalham motivados numa cultura de experiência, além de projetadas e desenvolvidas com a mesma atenção em todos os detalhes.

O último elemento que realmente diferencia O DT da AV é a narrativa. Quando planejamos os vários momentos da verdade ao longo da jornada do cliente estamos estruturando uma série de eventos que se ligam entre si em ordem sequencial ao longo do tempo.

Um bom praticante de DT, chamado designer, é capaz de imaginar cenários futuros complexos, visualizá-los e então revelar tais visões na realidade por meio de narrativas para testar ideias. A narrativa se constitui na maneira mais efetiva para transmitir ideias complexas, multidimensionais para apoiar inovação com mudança organizacional.

Permite compartilhar normas e valores decorrentes do passado da organização descrevendo o seu futuro potencialmente. Permite também desenvolver a confiança comunicando competências e compromissos, além de apoiar o compartilhamento de conhecimento tácito por meio de uma eficiente troca que dispara a compreensão na mente dos ouvintes. Ainda facilita o “desaprendizado” ao remodelar perspectivas durante o repensar de como e o porquê de novas oportunidades gerando conexão emocional.

Bons designers são capazes de reformular a questão para contar uma boa narrativa, e para isto devemos ter uma boa historia. Na fase de análise temos que descobrir a história e na fase de síntese contar uma nova história que convença.

Narrativas interessantes nos conectam a companhias. As companhias oferecem características enquanto que os clientes procuram benefícios. As narrativas as unem. Uma boa narrativa possui um protagonista, uma motivação, um conflito, um enredo imperativo, uma trama narrativa e um cenário, que quando falado também deve ser num tom adequado de voz.

Uma boa experiência, que se desenrola ao longo do tempo, envolve os participantes e permite que eles contem as próprias histórias tendo assim superados dois grandes obstáculos: conquistar a aceitação na organização e divulgar a ideia para o mundo. Se uma ideia for verdadeiramente inovadora, ela contesta a situação vigente.

Inovações deste tipo podem ameaçar sucessos anteriores e fazem dos inovadores de ontem os conservadores de hoje. Certamente uma narrativa bem contada, deve provocar uma poderosa reação emocional, isto é, deve “pegar na veia”.

A Intel passou de etiquetas adesivas a uma abordagem que usa histórias para explorar o futuro da computação. Após conquistar os PCs a Intel agora está promovendo uma transição para a computação móvel. Preparou a “Visão Futura”, uma série de cenários em vídeo para mostrar como, num futuro próximo, poderemos integrar a computação móvel ao nosso cotidiano. Um destes filmes pode ser visto no Youtube.

Uma nova ideia precisará uma história significativa de forma cativante se quiser ser ouvida. Qualquer pessoa que tenha uma experiência positiva com uma ideia deve ser capaz de expressar seus elementos essenciais de uma forma que incentive outras pessoas a experimentá-la. Devemos criar narrativas em torno de uma ideia, transformando as pessoas de observadores passivos em participantes envolvidos.

Para todas as informações necessárias para o DT, utilizamos o Canvas, um quadro onde se pode verificar uma série de informações iniciando com as parcerias principais a que temos acesso, as atividades-chave necessárias que teremos condições de desempenhar, os recursos principais que serão necessários para criar valor, as propostas de valor, dados sobre o relacionamento com clientes que queremos conquistar e reter, os canais pelos quais queremos chegar aos clientes, e naturalmente os segmentos de clientes que queremos atingir. Certamente consta também tanto a estrutura de custos, mostrando que as receitas geradas ultrapassarão os custos, relacionando como serão geradas as receitas junto aos clientes.

Se queremos inovar e manter nossa organização na vanguarda, podemos utilizar a AV na fase de Inspiração do DT, constituindo-se num conjunto potente que pode ser utilizado pelas empresas mais criativas que prezam a Qualidade de seus produtos e serviços. Assim como para entidades sem finalidade lucrativa para atingir seus objetivos.

João Mário Csillag é engenheiro (ITA), mestre e doutor em administração de empresas (EAESP-FGV), professor titular aposentado e ex-chefe do departamento de produção, logística e operações empresariais da EAESP-FGV e membro da Academia Brasileira da Qualidade (ABQ).

Este artigo expressa a opinião dos Autores e não de suas organizações.

Siga-nos nas Redes Sociais

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Posts Relacionados