Recuperação do Brasil Pós COVID-19
Acadêmico Francisco Paulo Uras é Engenheiro eletricista pela Escola Politécnica – USP, Fellow Member, CQE, CQA, CMQ-OE pela ASQ – American Society for Quality, Palestrante do PEC-FGV-SP (2001 a 2009). Membro do Comitê Critérios e Instrutor dos Cursos da FNQ (1993 a 2014) e Membro do Conselho de Notáveis da Fundação Nacional da Qualidade – FNQ.
Acompanhe a sua entrevista realizada na 2ª quinzena de julho, à distância.
Como você percebe os impactos e consequências da COVID-19?
Os impactos e consequências são de duas naturezas, que embora inter-relacionados, produzem efeitos diversos: os diretamente relacionados à doença e os relativos à forma como os governantes nas esferas estaduais e municipais afetaram nossas vidas.
Diretamente relacionados com a doença podemos destacar os esforços mundiais para o desenvolvimento de uma vacina, a conscientização para os cuidados com a saúde em geral e com a COVID-19 em particular e a mudança nos protocolos de segurança da área médica, não somente para o atendimento hospitalar à COVID 19, como também para os demais procedimentos.
Já o confinamento e o isolamento social, definidos pelas autoridades estão causando uma grande crise econômica e tiveram fortes impactos e consequências no nosso modo de viver, na forma de trabalhar e nos nossos relacionamentos familiares e pessoais.
O que fazer no curto prazo, afora as medidas já tomadas, para atenuar o impacto econômico, empresarial e social?
Similarmente a todos os países afetados pela COVID-19 o Governo, em todos os níveis, já tomou medidas de apoio à economia, tais como auxílio emergencial, flexibilização dos contratos de trabalho, crédito para empresas, carência para pagamentos de serviços etc. No curto prazo é fundamental que haja acompanhamento, controle e ajustes para que este apoio não fique somente no campo das boas intenções e das iniciativas passageiras.
O importante agora, nesta fase de retorno à normalidade, será incentivar o crescimento da economia e evitar a ocorrência de uma segunda onda de contágio. Neste sentido o básico será propiciar condições de retorno às atividades sem provocar aglomerações, seja nos transportes públicos, seja nos estabelecimentos.
Para atenuar o impacto econômico, empresarial e social a abertura deveria contemplar horários integrais de atividades, porém, com períodos diversos. Por exemplo: indústria das 7h às 16h, comércio das 11h às 20h, escolas com horários e períodos de férias diferenciados etc.
Como a qualidade e a gestão podem ajudar para saída da crise?
Qualidade e gestão são pilares básicos em qualquer situação. Especialmente na saída da crise será fundamental evitar desperdícios (“fazer certo a primeira vez”) e ter uma gestão com alta produtividade (fazer mais com os poucos recursos disponíveis).
Historicamente, nas épocas de crise e redução de custos, a área da qualidade tem sido sempre atingida. No século passado, quando a indústria separava as áreas em “produtiva” e não produtiva”, a qualidade ficava como não produtiva. Felizmente este enfoque já foi superado e agora nesta crise será fundamental a visão não imediatista, com o uso intensivo das técnicas da qualidade e gestão.
Sempre dizemos que o Brasil é o país do futuro: Isso pode acontecer algum dia? Quando? Como será possível?
Há 80 anos, Stephan Zweig escreveu seu livro “Brasil, o País do Futuro” e infelizmente continuamos carregando este triste rótulo.
Nunca devemos, no entanto, nos esquecer de que o País reúne condições insuperáveis no que se refere a recursos minerais, água, clima, extensão territorial etc. Temos regiões com mais de 300 dias de sol por ano, extremamente propicias para a geração fotovoltaica, condições eólicas muito melhores que países desenvolvidos, vasta área propícia para agricultura e pecuária, sem necessidade de desmatamentos na Amazônia.
Sabemos que as crises afetam mais fortemente os mais frágeis, mas também é certo que trazem oportunidades em quantidades proporcionais às fragilidades.
Com a retomada da economia mundial a demanda por alimentos, que nunca deixou de existir, será sem dúvida uma grande oportunidade para o Brasil se tornar o principal player mundial, tanto na agricultura como na pecuária.
Vale destacar que o agronegócio no Brasil vem acumulando recordes há anos e foi um dos setores que não teve queda, mesmo durante o auge da COVID-19.
O caminho para ser um País desenvolvido passará obrigatoriamente por grandes investimentos e esforços de melhoria e inovação nas áreas da infraestrutura, saúde e educação.
Na infraestrutura, recentes medidas governamentais e a adequada gestão parecem nos mostrar que estamos no caminho certo, que, por ser longo, demandará constância de propósitos.
Na saúde temos um sistema que, apesar de mal gerenciado, pode ser considerado como um dos melhores no mundo em termos de capilaridade e universalidade de atendimento. A crise da COVID-19 expôs de forma dramática nossas já conhecidas mazelas, mas gerou uma grande oportunidade de melhoria com a alocação de recursos extraordinários nunca feitos na área da saúde em tão pouco tempo. Mostrou também a generosidade de nossas Organizações, com uma quantidade de doações nunca vista. Cabe agora fazer que este surto de benemerência seja internalizado na nossa cultura. Os milhares de leitos em Hospitais de campanha só poderiam ser desmobilizados se forem aproveitados em novas Unidades Hospitalares permanentes ou para modernização das existentes.
Que conselhos você daria a um jovem que está trabalhando e passa a viver esta situação de crise?
Conforme mencionado por Shakespeare, só se deve dar conselhos em duas ocasiões: quando é pedido ou, quando é caso de vida, ou morte.
Dar conselhos é relativamente fácil e os jovens são regularmente bombardeados com muitos. O difícil é atingir e impactar os jovens que geralmente evitam ouvi-los, e quando o fazem geralmente só os escutam, sem, no entanto, internaliza-los.
Considerando que a crise da COVID-19 é uma questão de vida ou morte e, numa tentativa de minorar os percalços dos que estão na fase inicial da grande jornada da vida, seguem cinco coisas que penso que deveriam ser incorporadas na vida de todos que queiram ser felizes e prósperos. (adaptado do artigo “Pensamentos para os jovens” de Philip B. Crosby, publicado pela Quality World Newsletter Dez/1991).
• Primeiro: ame a Deus. Não é possível tratar de sua vida e do mundo unicamente com seus recursos. Deus providencia os fundamentos estáveis da sua vida. Ele está sempre presente e é sempre o mesmo. Para estabelecer o relacionamento com Deus é necessário somente aceitar Sua oferta de graça.
• Segundo: trate bem seus semelhantes. Respeito para com os outros é essencial para o balanceamento de sua própria vida. A forma como você trata os outros é uma previsão de como você será tratado. Procure prestar serviços na vida. Quanto mais você se dispuser a prestar serviços para os outros, maior será o fluxo de retorno para você.
• Terceiro: permaneça aprendendo e buscando a inovação. A “meia vida” da sua educação escolar é de menos de dois anos. Isto significa que metade daquilo que você aprendeu será obsoleto ou incompleto muito brevemente. Portanto, é necessário ler, estudar e estar envolvido para poder lidar com as coisas atuais. As pessoas tendem a raciocinar com opiniões em vez de fatos quando param de aprender.
• Quarto: estabeleça objetivos e metas. Cada objetivo que estabelecemos precisa ter um número associado. Metas genéricas – vou melhorar minha performance / vou inovar no meu trabalho / vou fazer exercícios – não são controláveis e são facilmente esquecidas. Aprenda a estabelecer metas objetivas e com valores definidos e desta forma terá como controlar seu progresso. (vou melhorar minha performance em 3% cada mês / vou trabalhar em pelo menos dois projetos de inovação por semestre / vou me exercitar por 30 min. diariamente)
• Quinto: seja feliz. O mundo foi criado para nossa felicidade e aproveitamento. Muitas pessoas criam seus próprios problemas através de uma atitude negativa ou falta de compreensão do sentido da vida. Receba cada dia com um sorriso e expectativas agradáveis; o dia irá agracia-lo da mesma maneira.
Mais do nunca, com a superação da crise da COVID-19 é preciso ter esperança. Acredite em você e no Brasil, apesar do catastrofismo da mídia em geral, que por interesse político, ou de marketing, dão forte ênfase somente ao lado negativo dos acontecimentos.
Só temos uma viagem na vida. Diga não ao conformismo e não seja influenciado por mídias tendenciosas e nem desperdice sua viagem com boas intenções utópicas sem realizações.
Aproveite a sua viagem, persiga seus objetivos e ao término você terá deixado um legado para as futuras gerações.
Muito obrigado pela sua entrevista e experientes conselhos aos jovens.