terça-feira, abril 23, 2024

Aonde chegaremos com a Inteligência Artificial?

(*) Claudius D’Artagnan C. Barros

A maioria das pessoas está perplexa com a nova onda envolvendo algoritmos, Inteligência Artificial e, em especial, o tal Chat GPT. O historiador israelense Yuval Noah Harari, conhecido pelos conceituados livros Sapiens, Homo Deus e 21 lições para o século 21, escreveu recentemente um artigo interessante, fazendo um alerta muito sério.

Ele comenta que é difícil para a mente humana captar e compreender as novas capacidades do GPT (Generative Pre-Trained Transformer, ou Transformador Pré-Treinado Gerativo) e de ferramentas similares (dotadas de Inteligência Artificial Gerativa e Aprendizagem de Máquina), capazes de manipular e gerar linguagem (escrita e falada), além de novos sons, músicas, imagens, como também figuras humanas. Tal coisa realmente parece surreal e causa estupefação.
Entretanto, é ainda mais difícil para o cidadão comum compreender a velocidade cada vez maior com que essas ferramentas digitais continuam sendo desenvolvidas, bem como, sua capacidade de operação de tal sorte progressiva que escapa completamente ao nosso controle, conforme diz Harari.

A linguagem sempre foi a capacidade mais evidente, importante e produtiva do “sistema operacional” humano. É a essência da cultura, lembra o historiador. Foi pela linguagem que o homem construiu os mitos e as civilizações; desenvolveu as religiões com suas complexidades teológicas; exercitou-se na filosofia, nas ciências físicas e humanas; construiu relacionamentos e erigiu as comunidades deles derivadas; implementou o dinheiro e as relações econômicas; concebeu estruturas jurídicas e as demais instituições sociais, enfim tudo o que se relaciona com a política e o Estado.
Eis agora, entretanto, uma nova “inteligência”; algo que criamos a partir da própria linguagem, diga-se de passagem, mas que não sabemos ao certo como interromper ou impor limites. Essa nova inteligência se apropriou da linguagem como sendo sua, para continuar, por sua própria conta, criando algoritmos neste processo exponencial de desenvolvimento em direção a… não sabemos exatamente o quê!
Basicamente é isso que Y. Harari revela em seu recente artigo. Trata-se, pois, de uma advertência assaz preocupante.

“Ao ganhar domínio sobre a linguagem, a IA está prestes a se apoderar da chave-mestra da civilização, capaz de abrir e fechar de cofres de bancos a santos sepulcros”, afirma ele.
Mas, afinal, que terrível distopia é essa que Harari nos escancara? Uma pista é dada pela recente foto do Papa Francisco que circulou nas mídias sociais, trajando um casaco para uso em lugares de intenso frio.
Pasmem, o papa nunca posou para essa foto! Foi tudo fruto de Inteligência Artificial.
Harari diz que esse extraordinário avanço da IA para controlar a linguagem, pode significar que os seres humanos passarão a viver, dentro em breve, num novo mundo culturalmente falso, de pura fantasia, em que nada que se diz é necessariamente verdadeiro e em que tudo que se escreve, diz ou argumenta pode ser apenas desvario,
sem nenhum respaldo nos fatos. Grande parte das narrativas que chegarem até nós, em breve, talvez não passem de mera ficção, incluindo notícias, relatos, histórias, melodias, imagens, fotos, leis, decretos etc. Tudo elaborado por uma inteligência não-humana.
O CEO do Twitter, Elon Musk, que pertence a um conhecido grupo de especialistas em IA (o Future of Live Institute), publicou recentemente uma carta aberta à sociedade (divulgada pela agência Reuters), pedindo uma pausa no desenvolvimento avançado de sistemas de IA, “…até que protocolos de segurança possam ser implantados e
auditados”. No texto, Musk traz o alerta de que… “há riscos potenciais à sociedade e a humanidade”.
Mesmo num contexto mais pessoal e rotineiro, o tema envolve também questões éticas. Um exemplo disso é dado pela psicopedagoga Claudia Del Corto, que cita o que disse um adolescente sobre a aplicação da IA em seus trabalhos escolares: “…eu ia usar a IA para fazer um trabalho de escola, mas meus pais disseram que seria desonesto de minha
parte, porque a escola proibiu o uso…”
Estamos sendo alarmistas e catastrofistas? Boa parte das pessoas dirá que sim e se as inquirirmos sobre isso, dirão algo como: “Ah, mas não vai ser assim! Na hora “H”, desligaremos a máquina!” Ou, “Implantaremos nela um protocolo de segurança que lhe ordenará: ‘Daqui para a frente, não! Pode parar agora’!”, tal como propôs o
escritor e futurólogo russo Isaac Asimov, num de seus livros da década de 50, Eu Robô, em que destaca as leis da robótica.
Talvez seja assim ou – quem sabe, consigamos implementar essa contenção no momento crucial. Porém, a mera admissão dessa possibilidade nos leva a três reflexões, todas elas cruciais:

Primeira: Este “momento crucial” não seria exatamente agora? Será que não estamos deixando esse processo ir longe demais, confiando ingenuamente que teremos o poder de controlá-lo, “quando chegar a hora”?
Segunda: Outros exemplos também sumamente importantes nos têm mostrado que somos por demais indolentes e imprevidentes, pelo simples fato de não enxergarmos os riscos que corremos com as ditas facilidades e conveniências da alta tecnologia. Catástrofes ambientais e a disseminação da violência, por exemplo, têm mostrado que não
usamos nossa capacidade de agir estrategicamente no momento certo.
Terceira: O universo digital, ao mesmo tempo em que impõe patamares cada vez mais elevados quando se trata dos sistemas que envolvem a IA, parece paradoxalmente induzir a inteligência humana a níveis cada vez mais tacanhos.
Isto porque estamos sendo convidados pelo universo virtual a pensar de forma cada vez mais superficial e menos esclarecida, cada vez mais estereotipada e preconceituosa.

Isto parece ser uma consequência imediata da passividade com que embarcamos na “excelência” das soluções digitais, tão cômodas, tão práticas e tão eficientes.
Em suma, parece que as soluções que o mundo digital nos oferece, conquanto mais cômodas, práticas, rápidas e eficientes, simplesmente nos deseducam ao nos seduzir em direção ao uso exíguo (ou mesmo ao desuso!) das nossas competências e do nosso aparato cognitivo.
Conforme alerta o sociólogo coreano Byung-Chul Han, autor do livro No enxame: Perspectivas do Digital: “… dada a eficiência e a comodidade da comunicação digital, cada vez mais evitamos o contato com pessoas reais e até mesmo o contato com o real como um todo. (…) A comunicação digital se torna cada vez mais sem corpo e sem rosto.” E, além disso, “…o excesso de informação faz o pensamento definhar”, alerta Byung.
À guisa de conclusão e ainda refletindo sobre os alertas que o desenvolvimento irrefreado da IA deveriam nos impor, vale a pena rememorar uma distopia cinematográfica dirigida pelo aclamado diretor James Cameron e estrelada pelo gigantesco ator Arnold Schwarzenegger: O Exterminador do Futuro.

Nesta envolvente obra ficcional, o vilão-mor é cibernético, frio, invisível e aparentemente indestrutível.
Trata-se da Skynet, uma rede de computadores dotada de IA que promove a construção de um ciborgue superpotente capaz de viajar no tempo, do ano 2029 para 1984, no intuito de, então, impedir o nascimento daquele que seria o líder da futura revolta humana contra as forças cibernéticas hostis da IA, que subjugariam a humanidade
num cenário pós-apocalíptico.
Quando foi lançado, em 1984, poucos espectadores de O Exterminador do Futuro imaginavam que, em um curto espaço de tempo, aquele entretenimento ficcional causaria inquietude e assombro em tantos previdentes.
Enfim, aqui estamos. Talvez nunca cheguemos ao ponto de enfrentar androides contra nós enviados de um futuro não tão distante. Mas, há decerto temores reais e tangíveis. Estaria o sucesso encantador de recursos de IA como GPT por exemplo, prenunciando a renúncia humana a sua preciosa capacidade de pensar, refletir, discernir… ou mesmo permanecer existindo como humanidade?
Pense nisso!!

(*) D’Artagnan é empresário, professor universitário, membro da Academia Brasileira da Qualidade e da Academia de Letras de Lorena/SP. Produz vídeos temáticos no Youtube, canal “Dartabarros”.

Este artigo expressa a opinião dos Autores e não de suas organizações.

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4 comentário sobre “Aonde chegaremos com a Inteligência Artificial?

  1. Excelente D’Artagnan.
    pessoalmente não creio que a IA irá nos levar como humanos que somos a renunciar de nossa capacidade de refletir e discernir sobre nossa condição humana. Acredito que, a exemplo do que vemos hoje, iremos intensificar esta capacidade crítica e quem sabe aproveitar o melhor que a IA pode trazer em benefício da humanidade.

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