sexta-feira, março 29, 2024

Tempo de crise é tempo de gestão

Gerd Altmann / Pixabay

Hayrton Rodrigues do Prado Filho

Pernambucano do Recife, graduado em Engenharia Eletrônica pelo Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA) com pós-graduação em marketing e propaganda pela FAE/CDE (Curitiba) e em gestão empresarial pela Duke University (North Carolina/USA), Jairo Martins desenvolveu as suas atividades profissionais na Siemens Ltda., no Brasil, e na Siemens A.G., na Alemanha, nas áreas de telecomunicações e tecnologia da informação, ocupando cargos de diretoria, CIO, gerência geral e vice-presidência. Apaixonado em tudo o que faz, atualmente é superintendente geral da FNQ e vem acompanhando o movimento pela qualidade no Brasil desde o início.

“Todo aquele que põe em prática uma iniciativa para aproveitar uma oportunidade ou sair de uma crise é um empreendedor. A motivação para empreender não deve ser a busca pelo lucro, mas a necessidade de se sentir realizado, bem-sucedido ou fazer a diferença no mundo, gerando valor para a sociedade. Há aqueles que alcançam isso ao abrir um negócio, outros, com projetos dentro da empresa em que trabalham ou na própria comunidade. A essência do empreendedorismo está na disposição em tentar algo para suprir uma necessidade interna ou externa e na resiliência para lidar com a frustração e o fracasso, inerentes ao processo”, acredita ele.

A FNQ, segundo Jairo, surgiu há 23 anos com a abertura da economia brasileira, no início da década de 90. “Algumas pessoas detectaram a necessidade de adotar padrões internacionais para orientar, avaliar e reconhecer a gestão, em busca de mais qualidade e competitividade. Ou seja, a gente reage sempre na hora da morte. Naquele momento o país tinha carros chamados de carroças, entravam produtos com qualidade e os nacionais não conseguiam concorrer. Em 11 de outubro de 1991, um grupo formado por representantes de 39 organizações privadas e públicas instituíram, em São Paulo, a Fundação para o Prêmio Nacional da Qualidade (FPNQ). A entidade sem fins lucrativos foi criada para administrar o Prêmio Nacional da Qualidade (PNQ) e as atividades decorrentes do processo de premiação, em todo o território nacional. Teve início, assim, uma trajetória em busca das melhores práticas da gestão para o aumento da competitividade das organizações e do Brasil. Em 2005, promoveu-se uma ampla reestruturação, sendo eleita uma nova governança na Assembleia Geral de Membros, reformulada a sua logomarca e retirado o nome prêmio da sigla, passando a se chamar Fundação Nacional da Qualidade”.

Hoje, explica Jairo, se no seu início havia a preocupação com a gestão da qualidade, a fundação busca a qualidade na gestão. Assim, os fundamentos da excelência expressam conceitos reconhecidos internacionalmente e traduzem-se em processos gerenciais ou fatores de desempenho que são encontrados em organizações classe mundial, ou seja, aquelas que buscam, constantemente, aperfeiçoar-se e adaptar-se às mudanças globais.

E quais são esses fundamentos: pensamento sistêmico; atuação em rede; aprendizado organizacional; inovação; agilidade; liderança transformadora; olhar para o futuro; conhecimento sobre clientes e mercados; responsabilidade social; valorização das pessoas e da cultura; decisões fundamentadas; orientação por processos; geração de valor. Os Critérios de Excelência garantem à organização uma melhor compreensão de seu sistema gerencial, além de proporcionar uma visão sistêmica da gestão, do mercado e do cenário local ou global onde a empresa atua ou se relaciona.

O Modelo de Excelência da Gestão (MEG) reflete a experiência, o conhecimento e o trabalho de pesquisa de diversas organizações e especialistas do Brasil e do Exterior. Nele, os Fundamentos de Excelência são expressos por meio de ações gerenciais. Para facilitar sua mensuração, qualitativa ou qualitativa, são propostas questões e solicitações de resultados a serem atendidas pela organização.

“Além disso, para que a excelência da gestão seja alcançada, são necessárias evidências para sustentar as avaliações apresentadas acima, que são consideradas complementos primordiais dentro do processo. O MEG orienta o passo a passo em cada uma das etapas. O modelo também possibilita a avaliação do grau de maturidade da gestão, pontuando processos gerenciais e resultados organizacionais. Proporciona, ainda, a compreensão do mercado e do cenário local ou global onde a empresa atua e se relaciona. Importante dizer que em qualquer processo de gestão sete palavras são essenciais: eficiência, eficácia, produtividade, inovação, ética, sustentabilidade e a gestão em si. Utilizar o MEG e responder aos seus questionamentos auxilia a organização a alinhar seus recursos; identificar pontos fortes e oportunidades de melhoria; aprimorar a comunicação, a produtividade e a efetividade de suas ações; e atingir os objetivos estratégicos”.

Martins observa, ainda, que como resultado a organização avança em direção à excelência da gestão e gera valor aos clientes e acionistas, à sociedade e a outras partes interessadas, o que contribui para a sua sustentabilidade e perenidade. O modelo não é prescritivo quanto a ferramentas, à estrutura ou à forma de gerir o negócio. Ele estimula que a organização esteja atenta às necessidades e expectativas das diversas partes interessadas e utilize essas informações para formular o seu planejamento estratégico e seus desdobramentos.

Incentiva, ainda, o alinhamento, a integração, o compartilhamento e o direcionamento em toda a organização, para que ela atue com excelência na cadeia de valor e gere resultado a todas as partes interessadas. Sendo uma tradução dos Fundamentos da Excelência, os Critérios estimulam a organização a responder de maneira ágil, assertiva e inovadora aos desafios propostos pelo cenário de negócios.

No momento, o foco é a competitividade em todos os ambientes, tanto privado como no setor público, buscando o alinhamento do privado e do público. “Dessa forma, muito mais do que preparadas, as empresas brasileiras devem se conscientizar da importância de estruturar a sua gestão, pensando em longo prazo. Infelizmente, as empresas brasileiras ainda têm uma cultura reativa e não preventiva. Modelos de gestão, a exemplo do MEG, podem ser aplicados em empresas de todos os portes e setores e é útil para avaliação, diagnóstico e orientação da gestão das organizações, mostrando os pontos fortes e fracos das organizações e, consequentemente, indicando onde estão as oportunidades de melhoria. Para obterem melhores resultados, inclusive financeiros, a organização precisa ter uma gestão integrada, em que todas as áreas, processos e atividades estejam voltados para a busca dos mesmos objetivos e de melhores resultados. Para alcançar a excelência da gestão e uma gestão mais eficiente, as organizações podem implantar um programa permanente de melhoria da gestão tendo em vista se diferenciar no mercado, além de estarem mais preparadas para cenários instáveis e de turbulência”.

Acrescenta que sustentabilidade e inovação estão cada vez mais presentes na agenda das organizações, sejam elas públicas ou privadas. Mais do que isso, empresas tem a sustentabilidade no seu core business e também implantam ações inovadoras, tornaram-se um diferencial de escolha pelos consumidores. Sendo assim, torna-se essencial para as organizações utilizar esses temas na estruturação de estratégias e objetivos que permeiam o negócio.

“Preocupar-se com o entorno, com o meio ambiente e com a sustentabilidade do negócio, são requisitos prioritários para a liderança das organizações da próxima década. Quem não entender esta nova ordem de coisas terá futuro incerto. Para garantir sua sobrevivência e competitividade no mercado, as empresas precisam estruturar sua gestão de forma sistêmica, considerando relevantes todas as áreas da organização, atividades e públicos de relacionamentos, e internalizar a cultura socialmente responsável, com práticas que visem à sustentabilidade e também incentivar a inovação das organizações, não apenas no nível da tecnologia, mas também na inovação de processos e produtos”.

O superintendente explica que o país vive uma crise conjuntural e política, mas quem atribui à crise seus fracassos e penúrias violenta seu próprio talento e respeita mais aos problemas do que às soluções. A verdadeira crise é a crise da incompetência. “O inconveniente das pessoas e dos países é a esperança de encontrar as saídas e soluções fáceis. Sem crise não há desafios, sem desafios, a vida é uma rotina, uma lenta agonia. Sem crise não há mérito. É na crise que se aflora o melhor de cada um. Falar de crise é promovê-la, e calar-se sobre ela é exaltar o conformismo. Em vez disso, trabalhemos duro. Acabemos de uma vez com a única crise ameaçadora, que é a tragédia de não querer lutar para superá-la. Tempo de crise é tempo de gestão. Buscar eficiência e eficácia no uso dos recursos disponíveis, fazer mais com menos. A única esperança reside na administração profissional. As empresas devem partir para um choque de gestão profissional radical ou não vão sair da crise”.

Ele acha que todo aquele que põe em prática uma iniciativa para aproveitar uma oportunidade ou sair de uma crise é um empreendedor. A motivação para empreender não deve ser a busca pelo lucro, mas a necessidade de se sentir realizado, bem sucedido ou fazer a diferença no mundo, gerando valor para a sociedade. “Há aqueles que alcançam isso ao abrir um negócio, outros, com projetos dentro da empresa em que trabalham ou na própria comunidade. A essência do empreendedorismo está na disposição em tentar algo para suprir uma necessidade interna ou externa e na resiliência para lidar com a frustração e o fracasso, inerentes ao processo. Persistência, perseverança e comprometimento são fundamentais, já que os resultados nem sempre vêm na quantidade e no prazo idealizados. Além disso, empreendedores de sucesso são unânimes em dizer que a inovação e o planejamento e monitoramento constantes são determinantes para a concretização de uma ideia”.

Complementa dizendo que naturalmente que se pode empreender fazendo-se mais do mesmo, mas o grande diferencial é tentar trazer um novo olhar para alguma atividade tradicional e incorporar algo que chame a atenção daqueles que possam se beneficiar com o negócio. “Por exemplo, se observarmos o mercado ultimamente, vemos que os empreendimentos não chegam a ser algo inusitado, mas contam com novas propostas de produtos e serviços já existentes, seja na forma de atendimento ou de comercialização. Isso vence o marasmo, a mesmice”.

A FNQ elaborou o Pacto pela Excelência da Gestão, um documento com propostas para as lideranças do executivo e legislativo brasileiros eleitas em 2014. Mais qualidade nos serviços de saúde e educação, políticas efetivas para a redução da violência, segurança pública e combate à corrupção foram questões unânimes nos resultados dos debates, chancelando o consenso popular das Manifestações de Junho de 2013.

Dentro de sua área de atuação, a FNQ reafirma, neste documento, a disposição de aprofundar o diálogo entre os setores privado e público em busca de boas práticas de gestão capazes de contribuir para solucionar questões estratégicas que impactam na competitividade das organizações e do país. Redução dos custos sistêmicos, investimentos permanentes em infraestrutura, reforma política, reforma tributária, ética e transparência na gestão pública, no setor privado e nas relações público-privadas, bem como a aplicação efetiva dos princípios do desenvolvimento sustentável são proposições das empresas que a FNQ representa e reverbera na sociedade. Para além da gestão da excelência, existe a convicção da necessidade de se desenvolver o sentido da cooperação nos negócios, por meio de mudanças nos ambientes de trabalho, comunidades e relacionamentos.

Nesse sentido, a fundação trabalha para que alguns paradigmas sejam superados com o objetivo de ativar uma nova consciência que direcione o consumo ao bem estar das pessoas e a inovação às reais necessidades da sociedade. Há algum tempo a FNQ acumula aprendizado sobre os efeitos da crise financeira global, a escassez de recursos naturais, o aumento da insegurança digital e outras turbulências que afetam a vida de todos. Particularmente, presencia na gestão de algumas filiadas os efeitos nocivos das mudanças climáticas nos sistemas hídrico e elétrico – contingências que as obrigam a reagir, muitas vezes tomadas pela perplexidade diante do ineditismo das situações.

Embora o mundo passe por uma crise no sistema de representação, temos certeza de que a liderança empresarial e política pode ser reconfigurada para disseminar um novo modo de ver e agir no mundo, mais criativo e resiliente à imprevisibilidade dos cenários, e que seja capaz de gerar coletivamente os resultados que desejamos e precisamos para a retomada do desenvolvimento. Na transição para a realidade digital, que transformará a atividade empresarial e a gestão pública, precisamos nos manter unidos e atentos, a fim de que a riqueza se traduza em prosperidade para todos e o crescimento não vá além da fronteira da ética e da sustentabilidade. No âmbito desse contexto e objetivos, a FNQ passa às lideranças eleitas em 2014 suas aspirações e propostas, na expectativa de iniciar 2015 com uma forte, amigável, consequente e produtiva parceria.

Nesse pacto, diz Martins, a educação é o principal ativo estratégico de uma nação que deseja ser protagonista no cenário global. “Por isso, precisamos agir imediatamente na busca de melhorias no sistema educacional, em todos os níveis de ensino. O desafio pela frente é grande e de médio e longo prazos, mas há alguns passos imediatos. Profissionalizar a gestão da educação é imprescindível, para que, em futuro certo, possamos contar com escolas e universidades de excelência, prontas para formar os talentos de que o Brasil precisa. As soluções para a melhoria da educação no Brasil não são simples e requerem a mobilização de toda a sociedade, bem como o aprofundamento da parceria entre os setores público e privado, em uma sinergia capaz de superar a diversidade de contextos e a dimensão continental do país, onde coexistem ilhas de excelência ao lado de escolas com infraestrutura precária, qualificação deficiente de professores, evasão escolar e falta de vagas. Enquanto não resolvemos questões elementares como essas, nações mais desenvolvidas já implementam as tecnologias de informação e conectividade nos métodos de ensino e no formato da sala de aula”.

Martins aconselha um cuidado especial no Brasil com as micros e pequenas empresas (PME) que têm crescido e ganhado espaço na estrutura econômica brasileira. As empresas deste porte conseguem crescer mais rapidamente do que uma grande companhia porque são mais flexíveis, se adaptam, se transformam e respondem mais rapidamente aos desafios. Para se ter uma ideia, elas tiveram nos últimos dez anos um crescimento expressivo na estrutura econômica do país: segundo dados do Dieese e do Sebrae, entre 2000 e 2010, foram criados 1,9 milhões de novos estabelecimentos deste porte no Brasil e atualmente elas são responsáveis por 51,6% dos empregos formais. “O desafio atual é fazer com que essas empresas que não se preocupam com a melhoria da gestão de seus negócios, passem a se preocupar. A não adoção de mecanismos de gestão e modelos de referência que permitam uma visão abrangente aumentam as chances de essas empresas perderem mercado para a concorrência e até encerrar o negócio. As PME devem identificar seus pontos fortes e oportunidades de melhoria, adotar um sistema de aprimoramento de sua gestão, aumentando sua competitividade”.

Ele aconselha alguns hábitos saudáveis que todas as PME deveriam fazer, o que facilitariam a gestão do dia a dia e levariam a resultados previsíveis, consistentes e replicáveis:

– Planejar antes de colocar a mão na massa. Elenque as atividades, considere e avalie possíveis cenários, tendências e variáveis que possam afetar a atividade. Isso ajuda a evitar desperdícios e retrabalhos, pois os eventuais obstáculos podem ser previstos e já considerados nas estratégias e planos definidos.

– Estabelecer metas. Sem meta, não se pode avaliar a efetividade das estratégias e planos adotados. As metas devem ser realistas, não podem ser muito fáceis nem muito difíceis. Avalie as vendas do seu colaborador com metas, por exemplo. Assim, você acompanha as atividades e pode estimular o trabalho, com comissões ou premiação.

– Definir indicadores de desempenho organizacional para medir o cumprimento das metas estabelecidas. Os indicadores como um todo na empresa devem permitir uma visão sistêmica do negócio. Não adianta, por exemplo, ter-se a produtividade aumentada se isso acarretar um maior número de acidentes ou defeitos e a perda da qualidade final dos produtos e serviços.

– Se ainda não limpou e organizou o ambiente de trabalho, um bom momento é agora, no começo do ano. Isso eleva a autoestima das pessoas e favorece a execução das atividades. Quanto mais fácil e rápido se encontra as coisas necessárias para realizar uma tarefa, tanto para itens físicos quanto arquivos digitais, maior a produtividade. Engaje que todos os colaboradores descartar o que não é mais necessário e organizar o ambiente.

Martins ressalta a importância da gestão de pessoas, ou seja, o relacionamento entre as lideranças e os colaboradores nas grandes corporações. Isso sempre foi tema de discussão, mas pouco se fala sobre essa mesma relação no contexto das micro e pequenas empresas. “Cabe ao líder estar aberto e receptivo para ouvir o colaborador e atento para implementar as inovações. Além disso, é preciso entender de que maneira se pode fortalecer e melhorar o ambiente corporativo nas pequenas organizações. O desempenho de uma empresa pode ser maximizado quando há o respeito mútuo entre as pessoas no ambiente de trabalho. Afinal, a falta de interesse ou até o desrespeito leva as pessoas a desperdiçarem tempo e energia e, consequentemente, perderem o foco no que de fato contribui para atingir os objetivos e para a otimização dos resultados”.

Cita que, de acordo com uma pesquisa de 2013, realizada pela Harvard Business School, em parceria com a London School of Economics, executivos de grandes empresas gastam mais de 18 horas por semana – um terço do seu trabalho semanal – em reuniões. “Desse total, de 25% a 50% do tempo é considerado desperdício. Mas como essa dinâmica funciona para pequenas e médias empresas? Nesse caso, muitas vezes, presenciamos justamente o oposto: falta de reuniões formais para o alinhamento”.

“Considerando que o chefe tem papel direto no desenvolvimento da carreira do profissional, ser exemplo é fundamental”, assegura. “Em reuniões para entender como melhorar o atendimento ou o ambiente na empresa com os colaboradores, os líderes não devem perder o foco da reunião, interromper aquele que está com a palavra sem que o raciocínio tenha sido concluído, interagir com laptop ou smartphone enquanto alguém está lhe dirigindo a palavra ou promover conversas paralelas. São exemplos de posturas que incomodam a todos e degradam a qualidade das relações”.

Além do mais, grande parte dos profissionais passa de oito a dez horas dentro das organizações. Nada mais adequado do que prezar o bom relacionamento, não só entre os colaboradores, como também com o gestor e o dono da empresa. Uma boa qualidade das relações é pré-requisito para a cooperação. Respeitar a diversidade na forma de pensar e de agir é a forma de se valorizar as pessoas, fundamento de excelência que torna as empresas mais competitivas e sustentáveis.

Uma visão bastante interessante de Jairo Martins se relaciona com o Carnaval que, segundo ele, pode ensinar muito para a gestão. “Não é de hoje que as escolas de samba e os blocos de frevo são considerados verdadeiros exemplos de organização. Afinal, para conseguir um desfile de tamanha grandeza, é exigido um alto grau de gerenciamento e estruturação. Durante o ano todo, é possível ver a integração das pessoas da comunidade e muita motivação individual. O alegre espetáculo que vemos nas avenidas é fruto de muito trabalho, identificação, competência e disciplina de todos, em busca de uma causa: ganhar o prêmio para sua agremiação. A missão é clara e o engajamento, generalizado. A ala de baianas das escolas de samba, por exemplo, conta com mulheres que desfilam todos os anos com roupas pesadíssimas e em sincronia”.

Soma-se a isso a visão sistêmica das demais alas que também é fundamental para o sucesso, com cada participante entendendo sua função durante a apresentação, para que os meses de treino e esforço conjuntos permitam alcançar o resultado desejado. Por fim, a criatividade, a inovação e a ousadia são marcas presentes nas escolas vencedoras a cada ano.

“Nas MPE não é diferente. Para se obter nota dez em todos os quesitos da gestão, os colaboradores têm de estar alinhados ao perfil da empresa, com similaridades entre si, pois juntar pessoas com afinidade de interesses é muito mais produtivo, divertido e prazeroso. O exemplo das escolas de samba e dos blocos de frevo serve para a vida e pode ser aplicado em qualquer organização, pois colaboradores que realizam atividades por paixão, ou causa, e não apenas pelo salário tendem a ser mais produtivos. Ou seja, contrate e valorize quem se identifica com a missão de sua empresa. Sem contar que pessoas apaixonadas trabalham além de suas obrigações”.

Conclui dizendo que assim como no carnaval, as organizações também devem estimular a inovação para que todos possam ter novos desafios, superar-se e adquirir novas competências e conhecimentos. Promover esse dinamismo acaba servindo até para revelar e reter talentos. “O que devemos fazer é transformar a organização em um grande campo de valores, permitindo às pessoas evoluírem com aprendizado e transformação. Muitas ideias e práticas devem ser avaliadas para um começo imediato. Ou seja, são pessoas movidas pela causa. Ótima organização, estratégia, processos bem resolvidos, pessoas motivadas e comunicação interna eficaz”.

Por fim, Jairo Martins fala de uma paixão em sua vida: a cachaça. Criador do termo cachacista, um neologismo para designar o sommelier da cachaça ou aquele que orienta os apreciadores na escolha da cachaça que melhor harmoniza com pratos e com o momento. Esse amor surgiu quando ele morava na Alemanha e percebeu que os alemães gostam da cachaça e da caipirinha.

“Notei com isso que o Brasil discrimina sua própria bebida, vi que ele tinha um destilado, mas não tinha orgulho dele. Assim, quis fazer algo para quebrar essa ideia e comecei a buscar mais sobre o assunto, fiz cursos e passei a dar palestras e aulas de cachaça, inclusive na Alemanha. O meu objetivo é difundir a cachaça e, sobretudo mobilizar o nosso povo para acordar para o patrimônio que temos e renegamos. Têm que mudar essa cultura que pedem caipirinha de vodca, meus amigos alemães ficam indignados com isso. Existe uma ignorância em relação à cachaça que releva seu entorno histórico e cultural”.

Conforme ele destaca, a cachaça nasceu no Brasil e foi o primeiro destilado das Américas, foi feita no Brasil Colônia em algum engenho, é subproduto da nossa cana de açúcar e não tem como negar sua importância sócia econômica no Brasil desde esses tempos. “Ela está nos cultos afro brasileiros, na música, ela influencia a literatura de cordel do nordeste e inspirou Chico Buarque na Opera do malandro e Paulinho da viola. Se ela faz parte disso ela é um importante ícone que tem que ser fortalecido”.

Os protagonistas dessa invenção são a cana de açúcar, o escravo africano e o imigrante português que, juntos, numa terra de índios, criaram a bebida que mais simboliza o espírito descontraído do brasileiro. “Passando por altos e baixos, vivenciando nesses 500 anos situações políticas, econômicas e sociais positivas e negativas, que serviram para fortalecer a sua estrutura, a cachaça saiu da senzala dos escravos e hoje está presente em todas as classes de mesa do mundo, principalmente nos Estados Unidos, Itália, Espanha, Portugal, França e Alemanha – o maior importador. No Brasil é a segunda bebida alcoólica mais consumida, o que a coloca na terceira posição entre os destilados mais preferidos do mundo”.

Em sua história, teve um longo período de decadência, durante o qual passou a ser vista com preconceitos, como bebida de pinguços, paus-d’água e cachaceiros, mas teve nova ascensão, quando foi escolhida como a bebida oficial da Semana de Arte Moderna de 1922. A partir daí, passou a inspirar cantigas, trovas e rezas, sendo tema de sambas, frevos e serestas, como parte integrante da realidade histórica e social brasileira.

“Hoje, como resultado da expansão desse movimento no âmbito nacional, a cachaça está ocupando espaço em bares e restaurantes do país, deixando para trás a pecha de bebida pouco nobre. Ao mesmo tempo, o exigente mercado internacional vem também se rendendo ao charme da mais brasileira das bebidas. Ao servir de base para aperitivos como batidas de frutas e a caipirinha, que representa a descontração do povo brasileiro e o sabor nacional, a cachaça tornou-se mais um ícone do Brasil para o mundo, juntamente com o carnaval e o futebol”.

Na Europa e, principalmente na Alemanha, a caipirinha passou a fazer parte dos cardápios da maioria dos restaurantes, hotéis e bares, podendo ser considerado como o drinque da hora, preferido pelo público de todas as idades. “De forma silenciosa, percebe-se que a cachaça, na sua forma pura de consumo, passa a figurar entre os digestivos oferecidos nas cartas de bebidas, destacando-se entre os tradicionais, como conhaque, vodca, tequila e grapa, ganhando cada vez mais a preferência dos consumidores europeus, americanos e, pouco a pouco, dos asiáticos”, finaliza com fervor Jairo Martins.

 

 

Hayrton Rodrigues do Prado Filho é jornalista profissional, editor da revista digital Banas Qualidade e membro da Academia Brasileira da Qualidade (ABQ) – hayrton@hayrtonprado.jor.br

Este artigo expressa a opinião dos Autores e não de suas organizações.

Siga-nos nas Redes Sociais

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Posts Relacionados