Benchmarking: Qualidade no Brasil e no Mundo

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Nigel Croft

 

Gostaria de esclarecer que, embora eu tenha nascido na Inglaterra, hoje eu tenho muito orgulho de ser brasileiro. Ao longo da minha vida, morei em vários países, onde tive a oportunidade de conviver com a sociedade e absorver sua cultura.

Quando fui convidado para falar do que se faz melhor na Europa, eu parei para pensar um pouco nas minhas experiências nos diversos países e percebi que há coisas boas e coisas não tão boas em cada um deles.

Eu me recordo que, depois de morar aqui no Brasil praticamente nos anos 80 e 90 inteiros, eu e minha família saímos do país, principalmente em função das preocupações de segurança. Campinas, onde moramos durante quase 20 anos, estava passando por momentos difíceis no final dos anos 90 – o Comando Vermelho tinha se instalado; havia sequestros; assaltos e assassinatos, e por questões de segurança da família decidimos fugir de tudo aquilo.

Ou, melhor, quem toma todas as grandes decisões da família foi minha esposa Naila, que decidiu! Um dia chegou para mim e me disse “Nigel; quero voltar a morar na Inglaterra (nós havíamos nos encontrado como estudantes de pós-graduação lá nos anos 70). Não vou sossegar aqui enquanto nossos filhos estão crescendo, querendo sair nas boates daqui a pouco, etc.”

Dizem nossos amigos que, apesar de ela ser brasileira de nascimento, hoje em dia ela é mais inglesa que eu, e eu sou mais brasileiro que ela! Então nós optamos por levar nossa família para a Inglaterra para (entre aspas) fugir da violência aqui no Brasil. Chegamos lá na Inglaterra, nos instalamos numa pequena cidade do Sudoeste do país, supertranquila, e um belo dia levamos os filhos para passear em Londres, uns 450 km da nossa casa. Chegamos de volta em casa, ligamos a televisão, e ficamos sabendo do atentado terrorista no metrô de Londres, que tinha matado nem sei quanta gente. Ou seja, a gente tinha trocado um conjunto de circunstâncias, de desafios, de riscos – um contexto – por outro completamente diferente. Então este seria o primeiro ponto da minha apresentação – que cada país tem seus pontos positivos e negativos.

Esta é uma brincadeira que se faz muito na Europa. Dizem que o Paraíso é onde os policiais são ingleses, os chefs são franceses, os mecânicos são alemães e as amantes são italianas (isto eu não posso afirmar por experiência própria!) – tudo isso organizado pelos suíços.

Por outro lado, o inferno é onde os policiais são alemães, os chefs são ingleses, os mecânicos são franceses e as amantes são suíças – tudo isso organizado por italianos! Gente – nós temos este país maravilhoso que se chama Brasil! Não se pode ficar reclamando que as coisas lá fora são melhores – vamos fazer as coisas aqui para serem melhores! Claro que temos coisas muito boas para aprender e melhorar baseados em experiências de outros países, mas não vamos esquecer as coisas boas que já temos aqui como ponto de partida!

Cada país na Europa partiu de uma cultura diferente. Quando eu era moleque, a Europa era muito diferente da Europa que conhecemos hoje. Com certeza mais tarde a gente vai acabar falando um pouco do “Brexit” – a saída da Grã-Bretanha da Unidade Europeia. Até certo ponto isto foi uma reação da população à diluição da cultura britânica através do aumento da entropia – quem estudou Química na escola sabe que a tendência natural é de aumentar a entropia – através do aumento da diversidade das pessoas morando no país e das suas culturas.

Mas, na minha experiência, para nortear estes meus comentários, fiquei pensando nos países onde tenho morado – nasci e fui educado na Inglaterra; morei durante quase dois anos na Noruega; passo bastante tempo cada ano em Portugal e Bulgária – e a palavra comum que eu vejo que o Brasil poderia aprender da Europa é a questão do respeito.

“Respeito é o ato de não fazer aos outros o que jamais gostaríamos que fizessem com a gente. É dar espaço para que os outros expressem suas opiniões, sem discriminações ou punições. ”  Falando um pouco do “Brexit”, eu não conheço ninguém – da minha família, colegas ou amigos – que votou a favor de sair da União Europeia.

Mas, todos respeitam a decisão democrática que foi tomada, e o mundo continua. Imagino que a mesma coisa deve acontecer com a eleição de Donald Trump nos EUA. “Respeito é não maltratar, humilhar ou espezinhar as pessoas, simplesmente porque nos consideramos certos ou melhores…. Respeito, ninguém te tira ou te impõe… Está na formação do seu caráter”. Então, esta cultura de respeito eu vejo como um dos principais pontos de aprendizagem para o Brasil da Europa.

Respeito à polícia. Vou contar uma história. A primeira vez que meus pais vieram me visitar no Brasil nos anos 80, vieram para ficar umas seis semanas conosco. Algum amigo meu perguntou para eles: vocês não estão preocupados que alguém vai assaltar sua casa enquanto estiverem aqui no Brasil? Minha mãe respondeu que não, porque tinha informado à polícia que a casa estaria vazia durante todo este tempo, e eles estariam olhando”. Claro que o pessoal aqui deu risada – que aqui no Brasil isso seria a última coisa que faria porque seria como um anúncio no jornal para os ladrões que a casa estava pronta para ser assaltada!

Então esta questão da cultura de respeito não é uma coisa fácil ou rápida para implementar, mas para mim isto é o ponto fundamental que o Brasil tem para aprender da Europa. Como dizia o Peter Drucker “Culture eats strategy for breakfast”. Não adianta desenvolver estratégias sofisticadas e complicadas se não houver uma cultura preparada para implementá-las.

Infelizmente, uma das primeiras coisas que eu aprendi quando cheguei no Brasil no início dos anos 80 era a “Lei de Gerson”. Levar vantagem em tudo. Passar por cima dos outros para não atrapalhar o alcance daquilo que nós queremos.

Eu não sou psicólogo, mas esta figura abaixo, de Paul Hersey, eu gostaria de dedicar ao meu querido e amado sogro, Jose Diniz de Souza, que me ensinou mais sobre qualidade que que qualquer outra pessoa (incluindo Deming e Juran!). Me ensinou sobre a simplicidade.

Este diagrama é muito simples. Veio da página 3 do livro antigo de Hersey “Organizational Psychology” – depois desta página o livro ficou bem mais complicado e técnico! Se o nosso objetivo for de “criar uma cultura da qualidade”, o primeiro passo é tomar conhecimento do conceito. Isto é relativamente simples, e não leva muito tempo.

Mas, temos que transformar aquele conhecimento em atitude, que leva mais tempo; depois transformar nossas atitudes em comportamento individual (mais difícil e demorado), e, finalmente, através das nossas ações, nossa liderança; mostrando exemplos para colegas e subordinados, vamos chegar onde queremos, que seria um comportamento grupal adequado que por sua vez vai ajudar o alcance do nosso objetivo. Não adianta esperar que os outros façam. Vá lá e faça!……… mas não tente fazer tudo de uma vez só. Lembro das palavras do Vicente Falconi. “Não espere para aprender tudo – vão acabar não fazendo nada! Aprenda um pouquinho, depois vai lá e faz! Depois aprende mais um pouco, e faça aquilo; e assim por diante”.

É assim que vamos conseguir implementar uma cultura de respeito; uns liderando através de exemplo; semeando os conceitos através de suas ações. Respeito mútuo entre colegas; entre governo e indústria; fornecedor e comprador, etc. Este para mim é a maior lição que temos para aprender da Europa.

 

Nigel Croft é metalurgista (Cambridge, Inglaterra), PhD (Sheffield, Inglaterra) e Harkness Fellow (Berkeley, CA, EUA). FCQI, CQP, MIMM, C.Eng. Atua na área da qualidade e avaliação da conformidade desde 1974. Atual Presidente do Subcomitê TC176/SC2 da ISO, responsável pelas normas ISO 9001 e ISO 9004, é membro da Academia Brasileira da Qualidade (ABQ).

Este artigo expressa a opinião dos Autores e não de suas organizações.

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